Gesivan Rodrigues e a banca de revistas mais democrática de Maceió

Gesivan Rodrigues na Banca Nacional

Ainda criança, Gesivan foi vendedor de angu pelas ruas o Vergel do Lago

Desde 1960 que os maceioenses aprenderam a conviver com a Banca de Revistas Nacional, do Gesivan Rodrigues Gouveia.

Filho do estivador João Rodrigues de Gouveia, Gesivan começou ainda criança a trabalhar, vendendo angu pelas ruas do Vergel do Lago, bairro onde morava com os pais e mais 10 irmãos.

“Quando meu pai foi obrigado a se aposentar e viver de um salário irrisório, tive que cair em campo para aumentar o orçamento da casa”, revelou em entrevista ao lembrar que sua mãe enchia uma lata de angu sobre um carro-de-mão e ele percorria as ruas ainda de madrugada.

Já trabalhando na banca, descobriu que ganhava mais alugando as revistas que vendendo. “Eu tinha muitos amigos em quem confiava e quase todos sofriam do mesmo problema de falta de dinheiro”, recordou Gesivam e citou que as revistas mais alugadas eram O Cruzeiro, Cigarra, Querida e Fatos & Fotos.

O prazo para devolver a revista era de dois dias: “Quem não respeitasse a regra, perdia não só o direito de continuar tendo acesso às revistas, como perdia a minha amizade”.

Sempre bem abastecida, a Banca sempre foi uma referência para leitores de várias camadas sociais, mas notabilizou-se nos anos 70 e 80 pela especial clientela de intelectuais, artistas e políticos.

Época em que o semanário Pasquim era um dos mais aguardados no início da semana. As reservas eram disputadas, já que ninguém queria ficar sem o famoso “hebdomadário” carioca, que sempre estava sujeito a apreensões pela Polícia Federal.

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Banca do Gesivan ao lado do antigo Hotel Lopes

Em novembro de 1970, quando a Ditadura Militar prendeu os jornalistas da redação do Pasquim, houve uma onda de solidariedade em todo o país. A Banca do Gesivan naturalmente passou a ser o ponto de encontro dos leitores do semanário do Rio. Lá se formavam rodas de conversa em que se discutia a censura.

Gesivan, em depoimento à Comissão da Verdade dos Jornalistas, lembrou como se dava a censura: “Eles chegavam, prendiam os jornais e levavam a gente para a Polícia Federal, ali em cima da Igreja Catedral (Mirante de São Gonçalo). Tinha o “seu” Porto, que era o censor. Ele perguntava de onde tinha vindo o material. Eu respondia que tinha vindo da distribuidora e que estava vendendo o que recebia da distribuidora. Ele conversava, mas liberava. Qualquer apreensão que tinha, ele vinha logo na banca”.

No início dos anos 80, a Ditadura já estava bastante enfraquecida, mas continuava a tratar os jornais da chamada imprensa alternativa como inimigos. Bancas de revistas passaram a sofrer atentados em todo o país. Os seus proprietários, temendo os danos, deixaram de vender esses jornais, o que decretou o fim do Pasquim.

Hotel Lopes nos anos de 1940

Hotel Lopes nos anos de 1940

Em Maceió, Gesivan teve a sua banca danificada com uma tentativa de incêndio.

Mas ele continuou expondo os tabloides de oposição e, graças ao apoio das organizações que lutavam contra a ditadura, manteve-se como um dos poucos que vendeu do primeiro ao último exemplar do Pasquim.

“Houve uma época que houve quebra-quebra de banca. Naquela época houve um movimento muito forte por aqui. O Aldo Rebelo, que hoje é [foi] ministro, se juntou com o pessoal do PCdoB e fez um movimento aqui, que reuniu muita gente. Era contra a Ditadura, que estava incendiando as bancas. Eu recebi várias ameaças, mas o movimento em apoio a minha banca fez baixar a pressão. Mas tentaram incendiar. Eles também vinham e arrancavam os cartazes que eu colava, mas depois do ato eles não vieram mais aqui”, lembrou Gesivan.

Sobre a censura a jornais alagoanos, Gesivan lembrou que só houve uma. “A única apreensão que teve foi a da Tribuna, que era na Rua do Sol. Eles disseram que era porque tinha uma matéria contra o sistema. Isso foi em 1979 ou 1980”.

Gesivan esteve na Banca na Praça do Montepio por 60 anos, inscrevendo-se com sua A Nacional na história da cena urbana de Maceió.

Faleceu na madrugada de 26 de dezembro de 2020, vítima de problemas cardíacos.

24 Comments on Gesivan Rodrigues e a banca de revistas mais democrática de Maceió

  1. Matéria como essa nos permite não esquecer tempos tenebrosos que vivenciamos em passado recente.É parte de nossa História.

  2. Ciro Pimentel Veras // 27 de maio de 2015 em 09:20 //

    Gesivan é uma cara genial, jornaleiro desde menino, figura culta, inteligentíssimo e grande amigo meu, um cara que respeito e admiro muito! Um cara que faz parte da história de Maceió, e só para lembrar, faz aniversário no dia 29 deste mês de maio! Merece todas as homenagens!

  3. EDNALDO MAIORANO // 27 de maio de 2015 em 11:32 //

    ESTIMADO GESIVAN, É PATRIMÔNIO CULTURAL DE MACEIÓ. SUA “BANCA”, É RECHEADA DA BOA CULTURA. ALÉM DISSO, HOMEM DE FINO TRATO. ESSE É CIDADÃO INCORPORADO À MAESTRIA CULTURAL DE MACEIÓ

  4. Luiz Araújo // 17 de junho de 2017 em 12:21 //

    Conheço Gesivan e sua banca desde a minha infância. Um sujeito super gente fina tal qual seu falecido pai. Podemos considera-lo como uma figura folclórica de Maceió – que resiste com sua banca a danada da passagem do tempo. Nossas homenagens ao grande Gesivan.

  5. fabiano vieira da silva // 3 de abril de 2018 em 17:20 //

    Lembro que no inicio dos anos 90 eu ia sempre comprar as revistas de artes marciais, ainda naquela época se falava muito de Bruce Lee e o astro de filmes americanos Vandame rsrsrsrsrsr.
    Na verdade, é uma banca que ainda ficou lá, mesmo contra a força do tempo e das modernas invenções tecnológicas!
    Outro dia eu passei de carro e fiquei abismado quando vi que o Gesivan ainda estava por lá!
    Me passou um filme na mente, pois lembrei que descia na rua do comercio e vinha caminhando pela rua onde se vendia muito bolo de macaxeira, depois passava pela praça Montipui e em fim na banca…
    A banca é reflexo da resistência do tempo e um exemplo de como se conservar no mercado, mesmo diante de um novo século que se mostrou tão moderno.

  6. Philippe Meilhac // 26 de dezembro de 2020 em 13:36 //

    Eu nunca fui muito convencional, e gostava de garimpar publicações alternativas. Por isso era cliente assíduo da banca de revistas dele. Nela, eu demorava um tempão, procurando algo diferente para ler, conversando com o Gesivan. Era uma pessoa fora de série! Sem dúvida alguma, pertence à história cultural da cidade de Maceió.

  7. José Duilio da rocha Pereira. // 26 de dezembro de 2020 em 13:49 //

    Conheci o Gesivam desde o ano de 1982, quando fui destribuidor do Diário Oficial da União. Batia muito papo principalmente de política. Que Deus o receba na pátria espiritual.

  8. José Ricardo // 26 de dezembro de 2020 em 13:54 //

    Dia de luto em Maceió. Ainda adolescente, conheci Gesivan e passei a ser seu cliente até hoje. Dia triste este.

  9. Cláudio Pereira Maciel Júnior // 26 de dezembro de 2020 em 14:18 //

    GESIVAN, EU O CHAMAVA CARINHOSAMENTE DE “CORÔA”, SEMPRE COMPRAVA CIGARROS E FOLHA DIRIGIDA, COM O SEM DINHEIRO , ELE COSTUMAVA DIZER: A PALAVRA DO HOMEM É UM TIRO, MAS TAMBÉM SE NO DIA DO PAGAMENTO ALGUÉM NAO CUMPRISSE A PALAVRA. “FARRAPASSE” “PRO CORÔA” ESTAVA MORTO ENTERRADO, VAI EM PAZ “CORÔA”, VOCÊ COMBATEU O BOM COMBATE ,ACABOU A CARREIRA E GUARDOU A FÉ.

  10. Gesi, grande figura entre leitores e intelectuais. Sustentou toda família com sua banca.

  11. Roberto Jorge // 26 de dezembro de 2020 em 14:59 //

    Gesivan se foi, mas deixou uma história de humildade, de amizade e de respeito com sua clientela.
    Quem passava na Praça Montepio, tinha ponto de parada obrigatório eu sua banca de revistas.
    Era carismático e atendia a todos com alegria.
    Gesivan, siga em paz ao encontro de Deus e da Virgem Maria.

  12. Alfredo Carvalho // 26 de dezembro de 2020 em 15:29 //

    Deixa muita saudade e leva muito da memória urbana da cidade e do estado. Ficamos mais pobres.

  13. Quantas lembranças do Gesivan. O conhecia desde pequena. Um ser maravilhoso, simpático e gentil com todos.

  14. Maria Izabel Gouveia Cavalcante // 26 de dezembro de 2020 em 16:45 //

    Gezivan era meu vizinho de bairro, morávamos no Vergel do Lago, pessoa de respeito, sempre lutando pela família, hoje Maceió perdeu um Alagoano honrado honesto trabalhador “DESCANSE EM PAZ MEU CONTERRANO NOS BRAÇOS DO SENHOR “.

  15. Edvanil braga // 26 de dezembro de 2020 em 17:29 //

    FHC, em homenagem só Homem honesto, trabalhador e Alagoano, imortize o nome do Gesivan,com um logradouro público, para que sua memória nunca seja esquecida, para novas gerações.

  16. Aluizio Ferreira da Silva // 26 de dezembro de 2020 em 18:02 //

    Com tua partida, Gezivan, deixaste uma lacuna que não pode ser preenchida na Cultura Maceioense.
    Quando estudante na vizinha Faculdade de Direito, quase todos os dias eu e outros colegas graduandos íamos à Banca Nacional, para ver as novidades ou simplesmente conversar e rir com teu permanente sorriso.
    Eras um erudito, apesar do pouco saber formal. Sabias os nomes de todos os clientes, e adivinhas os nossos gostos, nem sempre literários: revistas e jornais “de sexo”, além de “O Pasquim” e outras publicações de crítica e sátira política.
    Partiste, Gezivan, e de ti nem pude despedir-me.
    Estás com Deus, fazendo rir o temperamental e bonachão São Pedro. Teu corpo descanse em paz!

  17. Gersivan , deixar uma lacuna difícil de ser preenchida , vai deixar muita saudade entre nós jornaleiros, Deus está esperando ele com alguma notícia boa da terra .

  18. Sérgio Rocha // 26 de dezembro de 2020 em 18:51 //

    Meus sentimentos a família e aos amigos que ele fez, e não são poucos. Fez cultura e amigos com sua Banca Nacional.

  19. Paulinho Santana // 26 de dezembro de 2020 em 21:32 //

    Meu querido amigo Gesi vai na paz irmão, certeza que vc deixou muita saudade dos ótimos papos carinho a toda família

  20. Eu batia sempre bons papos sobre a nossa política com o Gési. Semana passada fui à banca, ele não mais estava lá.

  21. Roberto Soares // 27 de dezembro de 2020 em 00:50 //

    Conhecer Gesival com sete anos de através do meu saudoso pai eles era muito amigos crescei hoje tenho cinquenta e dois mas quando eu passava no centro de Maceió eu chegava na banca do gesival para conversar Genival é para como um tio descanse em paz tio gesival

  22. sidneyprotasio@gmail.com // 27 de dezembro de 2020 em 07:53 //

    Foi muito triste essa notícia,pois trabalhei no cartório próximo a banca de revista e ia sempre lá, que Deus conforte seus familiares e que vc esteja em um bom lugar…

  23. Sinval da Silva // 27 de dezembro de 2020 em 09:41 //

    Eu era criança conheci esse cara eu também morava no Vergel lembro dele na banca de revista sempre sorrindo.

  24. Para mim ele foi sempre o Djavan, pq até agora digitando este texto eu tenho dificuldade de pronunciar seu nome aí como o som é parecido eu mandava Djavan. Na banca dele, na frente dele eu lia um pouquinho da Veja e comentava, um pouquinho da Isto É e comentava, da Carta Capital e comentava. Gostava também dos horóscopos da Marie Claire e da Caras. Estas duas era só p mim. Não tinha comentários. Uma frase do Djavan q eu sempre provocava e qd ele dizia a gente dava boas gargalhadas era: – Não existe democracia sem mentiras e capitalismo sem roubo e kkkkkkkkkkk. Vai c Deus Camarada.

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