Alunos e professores de escolas públicas de Maceió sofrem com calor extremo, ausência de estrutura e falta de climatização

Docentes denunciam que não há condições adequadas para o aprendizado e que calor elevado tem prejudicado aprendizado e afastado estudantes
Professores e alunos vêm sofrendo com calor e estrutura precária das escolas. | IMAGEM: Tv Pajuçara.

Os primeiros meses de 2024 têm sido marcados pelo calor intenso e pelas temperaturas bem acima do corriqueiro. Essa elevação acontece em escala global e afeta grande parte da população, como revela o relatório preliminar da Organização Meteorológica Mundial (OMM), que indica ainda que 2023 foi o ano mais quente desde 1949.

Conhecido internacionalmente justamente pelo seu clima de verão,  o estado de Alagoas não poderia ficar de fora desse cenário escaldante, com municípios atingindo os topos das listas de cidades mais quentes do país diariamente.

Pão de Açúcar, por exemplo, registrou – na última terça (12) – a máxima de 39,6°C e ocupando o posto de ponto de calor mais alto do Brasil, segundo dados do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). Palmeira dos Índios (37,9°C) e Piranhas (37,8°C) também marcaram presença no ranking.

E quanto a Maceió? A capital alagoana foi mais uma a figurar entre as mais quentes do Brasil. Ela foi classificada como a segunda capital mais quente do Nordeste, no dia 11 de março, com 34,3°C, ficando atrás apenas de Teresina (35°C).

Essa onda de calor nunca antes vista trouxe consigo consequências graves, escancarando a emergência climática que vivemos e que atinge de forma desigual as populações mais vulneráveis, as quais possuem mais dificuldades para se proteger das altas temperaturas.

Diante disso, professores das redes públicas de ensino de Maceió (municipal e estadual) denunciam a falta de condições mínimas para atuação, com escolas sem estrutura e sem climatização adequada, o que não permite – em diversas situações – que os profissionais e os alunos permaneçam em sala de aula.

A Mídia Caeté conversou com quatro professores, que optaram por não se identificar. Eles lecionam na Escola Estadual Profª Aurelina Palmeira de Melo (Vergel), na Escola Estadual Campos Teixeira (Ponta da Terra) e na Escola Municipal Padre Pinho (Cruz das Almas).

Uma professora, que dá aulas em duas das escolas citadas acima, relata a dificuldade encontrada para trabalhar em sala de aula diariamente e afirma que os poucos ventiladores não dão conta de aliviar o forte calor.

“Trabalho em duas escolas do estado – uma na Ponta da Terra e outra no Vergel – Na primeira, temos ventiladores em maioria das salas, mas isso somente não está sendo suficiente. Eles não estão dando conta do calor e os alunos estão passando mal. É uma sensação de desconforto que todos passam, professores, alunos. Está sendo bem difícil!”, diz a professora.

Ela complementa alertando para a situação da escola Profª Aurelina Palmeira de Melo.

“A situação na escola do Vergel está muito pior, porque ela vem passando por uma reforma desde o ano passado. Uma reforma muito lenta que retirou muito dos ventiladores das salas. Tem estudante que não está indo por conta do calor. Os próprios alunos e professores estão tendo que levar seus ventiladores para a aula”.

Um professor reforça o cenário descrito anteriormente, alegando os mesmos problemas na estrutura do colégio.

“A​​tualmente, a escola não possui praticamente nenhuma climatização, pois acabou de passar por um processo de reforma que ainda não foi concluído. Os ventiladores antigos foram retirados e as janelas de madeira substituídas por janelas de vidro, que tornam as salas de aula ainda mais quentes porque não filtram a luz solar. A mudança foi feita com o objetivo de que as salas passassem a ser climatizadas, comportando ar-condicionado, mas começamos o ano sem climatização e sem previsão para o término da reforma e a chegada dos aparelhos. Algumas poucas salas ainda mantêm um ventilador em estado bastante precário, mas a maioria não possui nem isso”, afirma.

Ambos os professores alegam que o calor deixou de ser apenas um incômodo a mais e tornou-se um verdadeiro tormento. Eles contam que, inclusive, já se sentiram mal e tiveram que paralisar as atividades.

“Várias vezes, já precisei interromper a aula para poder respirar um pouco, pois ninguém estava aguentando a sensação térmica nas salas. Teve aula que eu só fiz da chamada, pois há turmas cujas salas não tem ventilação nenhuma. As aulas precisaram ser reduzidas para 50 minutos”, relata a professora.

Estudantes protestaram em busca de soluções. | IMAGEM: Tv Pajuçara.

O professor relembra situações semelhantes, vividas por ele e pelos alunos: “Já me senti muito mal e tive que interromper a aula e me sentar por alguns minutos para conseguir me recuperar. Em determinados momentos do dia, a luz do sol entra em cheio na sala de aula e ocupa o espaço do quadro branco inteiro, sendo muito difícil conseguir escrever algo no quadro ou ficar em pé na frente da turma. Vários alunos já passaram mal. Presenciamos, diariamente, alunos tendo que ir embora para casa porque não estão se sentindo bem, e mais de uma vez os gestores tiveram que acompanhar os alunos até a UPA por causa do calor extremo”.

A FALTA DE CLIMATIZAÇÃO E A DIFICULDADE DE APRENDIZADO

Um outro professor dá aula na Escola Municipal Padre Pinho e lista os mesmos problemas mencionados pelos colegas de profissão, apontando que a ausência de climatização, no calor insuportável, só traz prejuízos a todos.

“Dou aula na rede municipal. O que tem nas salas são poucos ventiladores, tem local onde o calor é imenso. Esse contexto prejudica demais o ensino e a aprendizagem, porque não permite uma concentração maior no assunto e nos conteúdos que estão sendo dados”, ressalta.

Outra professora concorda e acrescenta que os professores também têm o seu rendimento diretamente prejudicado devido ao calor.

“Com certeza, [o calor] tem prejudicado muito. Prejudica na minha concentração como professora, na concentração dos alunos, eles ficam muito inquietos, mais do que o normal, reclamam muito do calor, saem da sala, ou ficam na porta onde é mais arejado. Por vezes, é difícil exigir deles um comportamento adequado dentro da sala de aula, já que nem eu aguento muitas vezes estar lá. Está sendo muito ruim trabalhar nessas condições, eu digo que as salas de aula estão insalubres. É impossível diante de uma emergência climática como a que estamos vivendo pensar uma sala de aula sem ar-condicionado. Não é luxo, é necessidade, é condição de trabalho e de estudo”, desabafa.

Já um dos professores do início do texto faz questão de falar sobre como a sensação térmica atrelada a estrutura precária desmotiva os estudantes e afeta o rendimento acentuadamente.

“A situação tem sido extremamente prejudicial. Os alunos estão desmotivados, desconfortáveis e, em muitos casos, se tornam mais agitados e agressivos por causa do calor. Há bastante estresse e muitas reclamações, e a maioria não consegue se concentrar nas atividades. O rendimento nos estudos declinou bastante e até alunos que sempre se mostraram bem motivados estão desanimados ultimamente. Além disso, os professores estão exaustos e tem sido muito difícil dar uma aula completa. Muitos estão levando os próprios ventiladores de casa para as salas. O transtorno tem sido enorme e a consequência disso tudo é um atraso imenso para o aprendizado e o desenvolvimento dos alunos”.

PROTESTO E ESPERA ANGUSTIANTE POR SOLUÇÕES

Recentemente, os alunos da Escola Estadual Profª Aurelina Palmeira de Melo, no Vergel, fizeram um protesto exigindo melhorias na infraestrutura da escola, bem como a instalação de ar-condicionados para amenizar o calor e seguir com o ano letivo sem problemas.

Segundo os professores, mesmo com a manifestação nada ainda foi feito.

“Após os protestos, a gerência da educação entrou em contato e fez uma visita à escola, mas até agora nenhuma medida realmente efetiva foi tomada. Afirmam que a lentidão do processo se deve à reforma da parte elétrica. Os alunos continuam estudando no calor e é notável o desconforto e falta de motivação nessa situação”, relata um dos professores.

A outra professora confirma que as medidas ainda não foram tomadas:

“Houve um protesto na última semana, onde os alunos protestaram pedindo a instalação de ar-condicionado – que não ocorreu ainda – e agilidade para conclusão da reforma que está em curso, uma vez que isso também viabilizaria a climatização nas escolas”.

O QUE DIZ A SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO?

Em nota, a Secretaria Municipal de Educação (Semed) afirmou que “estão em andamento, na Semed, projetos de requalificação da rede elétrica que irão garantir a climatização de todas as unidades escolares de Maceió até o final de 2024. Hoje, há 32 projetos aprovados em execução. Enquanto os projetos são executados, mais de mil novos ventiladores já foram adquiridos e distribuídos em todas as unidades escolares onde havia carência”.

O QUE DIZ A SECRETARIA ESTADUAL DE EDUCAÇÃO?

Já a Secretaria de Estado da Educação (Seduc) informou que “medidas seguem sendo adotadas no sentido de proporcionar um ambiente escolar cada vez mais propício à aprendizagem, considerando, inclusive, o aumento das temperaturas em várias regiões do país em 2024”.

Segue nota na íntegra:

“A Secretaria de Estado da Educação (Seduc) informa que, somente em 2023, o Governo de Alagoas inaugurou e reformou 26 escolas, proporcionando melhores condições de trabalho aos profissionais de educação e fortalecendo o processo de ensino e aprendizagem em toda a rede estadual. 

Somadas às 29 creches do programa Criança Alagoana inauguradas em diversas regiões do estado, garantindo, assim, o pleno desenvolvimento de milhares de crianças no período da primeira infância, o governo estadual investiu quase R$ 150 milhões, no mesmo ano, em infraestrutura escolar.

Já em 2024, a previsão é de que mais 70 escolas recebam melhorias estruturais, que vão contemplar, inclusive, a construção de ginásios poliesportivos e a climatização das salas de aula.

Para se ter uma ideia, na Escola Estadual Estadual Gilvana Ataíde, localizada na Santa Lúcia, parte alta da capital, 30 novos aparelhos de ar-condicionado estão sendo instalados nas 15 salas de aula da unidade, perfazendo um investimento de R$ 137,7 mil. Ano passado, a mesma escola – que conta, inclusive, com ginásio poliesportivo – passou por uma ampla reforma na qual o Governo de Alagoas investiu R$ 3,2 milhões.”

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