Sem possibilidade de comercializar seus artesanatos fora das aldeias e desprovido de assistência pública suficiente para manutenção de renda – e mínima reparação de danos provocados por todo o território que lhe foi roubado – o povo da etnia Fulniô, de Águas Belas, situada no agreste e sertão de Pernambuco, tem feito o possível para garantir a subsistência neste período de pandemia. A principal forma encontrada ao alcance da aldeia foi a venda online de seus produtos de artesanato – o que se estende para rifas e outras ações.
Ao longo do ano, o mês de abril tem uma importância bastante específica para a nação Fulniô. É neste período que, segundo Falê Fulniô, os indígenas se dividem em grupos e seguem viagem para diversas capitais do Brasil. “Divulgamos nosso trabalho, fazendo apresentação nas escolas e rituais com nossos amigos brancos, vendendo nosso artesanato, que é de onde tiramos nosso sustento. Fazemos isso todos os anos. Depois do mês de abril, voltamos para a nossa aldeia e já começamos a trabalhar fazendo artesanatos já para o ano seguinte”.
A pandemia do Coronavírus atravessou abril e a imposição do necessário isolamento trouxe consequências ainda mais difíceis à comunidade. Na aldeia, quatro indígenas morreram – três deles idosos. Os demais têm se recuperado e recebem a assistência da Secretaria de Atenção Especial à Saúde Indígena (SESAI). Com escolas fechadas, comércios e praças vazias, os Fulniô precisaram buscar soluções por conta própria. “Quando a gente se preparava para viajar, recebemos a triste notícia de que não poderíamos por conta dessa pandemia. Então tudo ficou mais difícil para nós. O único jeito foi fazer trabalhar dessa forma, fazendo rifa ou vendendo alguma coisa pela internet e enviando por correio”, comentou.
Segundo Falê Fulniô, algumas situações têm auxiliado também as aldeias, como envio de algumas cestas básicas, e ações de solidariedade. “ Outras famílias vivem de agricultura, algumas pessoas têm um emprego, algumas vivem através da aposentadoria de parentes idosos”, cita. A terra para plantio também auxilia aqueles que ainda atuam na agricultura. O problema é que o trecho que restou de todo o território roubado em Águas Belas, ao longo da história, fica ainda menor com o crescimento da aldeia e com a falta de demarcação. “Parou tudo [processo de demarcação]. Todos os anos inventam uma desculpa diferente. E a Fundação Nacional do Índio (Funai) não tem prestado mais”.
Além da histórica ausência de reparação do território indígena através da demarcação, a FUNAI tem inclusive protagonizado ataques contra os povos. O mais recente trata-se da retirada de proteção de 235 terras indígenas contra o registro de propriedades. Na prática, a IN 9/2020, editada em 16 de abril, cria uma indevida apropriação privada das terras indígenas. O Ministério Público Federal ingressou com ação civil pública contra a normativa, pontuando uma série de vícios, como a ausência de consulta prévia aos povos indígenas, violação dos princípios da legalidade e da publicidade, e por incentivar a grilagem de terra e conflitos fundiários.
Resulta que, em meio a essa gama de negação de direitos, resta à comunidade enfrentar o período de pandemia onde tudo se agrava – com a forma em que sempre caminham: de resistência. “ Temos Chanduca, cocar, colar de toda diversidade, e pulseiras”, menciona Falê Funiô. Questionamos sobre a polêmica a respeito de apropriação cultural. Falê Fulniô relata que o povo Fulniô percebe de bom grado o uso de acessórios indígenas por pessoas não indígenas. “A gente não vê não como apropriação. Quando vejo alguns [não indígenas] usando penso logo que essa pessoa gosta de índio. É assim que pensamos”, relata.
Diversas artes podem ser verificadas abaixo:
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Para quem quiser adquirir alguma peça de arte FulniÔ, basta enviar mensagem em direct pela página do Instagram: @etnia_fulnio