Conselheiro da Braskem horroriza, mas também nos dá uma admissão importante

Sequer ensaiar essa fala é escarnear com todas as pessoas que vivem nesta cidade, onde a mineração criminosa da empresa esvaziou e destruiu cinco bairros, expulsou mais de 50 mil pessoas de suas casas

É de horrorizar o anúncio do conselheiro da Braskem, João Paulo Nogueira Batista, de que “a dita tragédia de Maceió não existiu”. Sequer ensaiar essa fala é escarnear com todas as pessoas que vivem nesta cidade, onde a mineração criminosa da empresa esvaziou e destruiu cinco bairros, expulsou mais de 50 mil pessoas de suas casas. Foram 148 mil pessoas afetadas, grande parte ainda ignorada intencionalmente pela empresa e seus aliados.

Tudo isso a gente já conhece: as remoções forçadas, a população do entorno ignorada intencionalmente, a destruição dos mangues e o impedimento dos pescadores de acessarem a Lagoa Mãe Mundaú, porque as minas da Braskem são canhões prestes a colapsar a qualquer momento. Já mencionei a via crucis que estamos em termos de habitação e mobilidade? “Ah, mas ele editou o texto,  referindo-se, entre vírgulas, à ausência de mortes”. Outra mentira. Ao que sabemos, houve pelo menos 14 suicídios, fora os adoecimentos ainda não contabilizados, mas que devem, sim, entrar na conta, da mineradora e seu rol de ações irresponsáveis e criminosas a que o conselheiro, com ego inflado e alienígena, estampa quase que como uma heroína.

Não se trata de uma pessoa má informada. Na reportagem divulgada no Painel SA, ele mesmo diz, com orgulho, que liderou todo o processo! Tampouco se trata de uma fala mal formulada, um “ops” que escapou das assessorias de comunicação ou gerenciamento de crise da empresa. É o cinismo da Braskem, em seu modo mais puro e emblemático. Um cinismo que não se descola do quanto a empresa tem investido com a publicidade e a autopromoção, em sua avidez de colher os melhores frutos do desastre socioambiental que causou. Uma propaganda que, senão possibilitada, foi pelo menos aceita por órgãos públicos. Afinal, Nogueira jogou para a cesta uma bola que recebeu do próprio Conselho Nacional de Justiça quando, em 2021, estampou a matéria “Caso Pinheiro: a maior tragédia que o Brasil já evitou”. 

Admissão da liderança

Só que o arremesso acabou saindo fora do aro. Mesmo horrorizada com suas palavras, não deu para perder de vista um dado interessante: a sinceridade com que ele admite que a Braskem, causadora de todo esse caos, liderou os acordos. Foram exatamente essas palavras, proferidas em seu Linkedin: “A ação coordenada de todos e a liderança da Braskem evitaram a tragédia”. Esse reconhecimento , talvez, tenha sido um tropeço que certamente incomodará os órgãos signatários dos termos, que – por tanto tempo – se esforçaram em divulgar que estavam responsabilizando a empresa com seus termos e acordos – quando, na verdade, lhe presenteavam com decisões e investimentos e até mesmo as posses dos imóveis e regiões destruídas. Já sabíamos que um negócio desses só podia ter partido da liderança da Braskem, mas não deixa de ser importante ver o conselheiro de administração da empresa admitir isso de forma tão pública e despudorada.

Seja como for, palavras como a de Nogueira Batista hoje são inaceitáveis e, felizmente – longe de sustentarem qualquer credibilidade – são e serão alvos de repúdio de toda a sociedade maceioense e alagoana que sabe, sim, a tragédia criminosa que agora enfrenta. Arrumem outros para enrolar porque, por estas bandas de cá, já deu para vocês, Braskem!

Apoie a Mídia Caeté: Você pode participar no crescimento do jornalismo independente. Seja um apoiador clicando aqui.

Recentes