No último sábado, 23, carreatas realizadas em todo o país, inclusive em Maceió, agitaram o pleito pelo impeachment do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Não é um movimento isolado. Além de pesquisas que demonstram uma queda significativa na aprovação do presidente, aumenta também a pressão para que sejam apreciados os processos na Câmara Federal. Já foram protocolados 62 pedidos na Casa, intensificando o questionamento sobre como os parlamentares têm se posicionado em relação à destituição de Bolsonaro. Até o momento, apenas dois deputados federais por Alagoas declararam favoráveis ao impeachment, quatro se colocaram contrários, e outros dois não quiseram manifestar posicionamento. Um deles não foi encontrado.
Em âmbito nacional, a grande maioria da Câmara não se manifesta sobre o assunto, incluindo o atual presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ), que também vem se presenteando com o privilégio da esquiva quanto à apreciação. Entre as mais de seis dezenas de processos, o máximo de posicionamento público do dirigente da Casa foi de que seria “inevitável” no futuro investigar o que houve na área de saúde. Conforme preconiza a Constituição Federal, um processo de impeachment deve ter necessariamente como porta de entrada a Câmara dos Deputados, através de uma primeira análise a ser realizada pelo presidente. Uma vez que seja julgada a procedência, o trâmite segue para uma comissão especial seguida pelo Plenário. Finalmente, parte para o Senado, onde o processo é liderado pela presidência do STF.
Em geral, não é um processo rápido – sobretudo ante a inexistência de qualquer “acordo com supremo com tudo” –, o que representa desafio às oposições que levantam a bandeira de que retirar Bolsonaro do poder é basicamente uma medida de saúde pública.
Por outro lado, sua conduta frente à pandemia faz cair por terra a recorrente argumentação de Maia de que iniciar um processo de impeachment desvirtuaria o foco do congresso na urgência da saúde pública, uma vez que, até o momento, a conduta de Bolsonaro frente ao Coronavírus é uma das principais razões que o empurram para uma desaprovação por parte da maioria das pesquisas .
Não bastassem os impasses políticos internacionais criados por Bolsonaro, que afetam a distribuição de vacinas contra o Coronavírus, as críticas se amplificam diante da grave crise sofrida pela população de Manaus que ficou sem oxigênio em ume negligência política criminosa que entra para a história. Levantamento da Agência Pública confirma que o coronavírus foi pauta da maioria dos pedidos – um total de 33. Entre outros crimes de responsabilidade em que o Chefe do Executivo foi denunciado, todos mapeados na referida reportagem, há tentativa de golpe de Estado, apologia à tortura, atentado à soberania nacional, quebra de decoro, crimes de racismo e práticas genocidas durante a pandemia, crimes contra o meio ambiente e povos tradicionais.
Neste ínterim, a Exame Research apontou que, em janeiro, 45% das pessoas avaliaram o governo de Bolsonaro como ruim/péssimo e outras 26% consideram regular; 27% votaram bom ou ótimo. Já no estudo da Datafolha, a rejeição de Bolsonaro foi apontada por 40% da população que classificou o governo como ruim/péssimo, 26% regular, e 31% bom/ótimo.
Como se posicionam os deputados alagoanos
A Mídia Caeté procurou os nove deputados federais alagoanos para saber como se posicionam diante da possibilidade de um impeachment. O levantamento foi efetuado prioritariamente através da assessoria dos parlamentares, mas também levou em conta algumas de suas declarações públicas e em redes sociais. Apenas um deles, Nivaldo Albuquerque, não foi contactado – nem mesmo por assessoria – e não atendeu nenhuma das ligações ou respondeu e-mail.
De forma pública, o deputado Paulão (PT) não só declara que há motivação para um impeachment, como ainda provoca Maia a se manifestar a respeito, ao declarar em suas redes sociais que: “Já passou da hora de Rodrigo Maia pautar o impeachment de Bolsonaro. Suas declarações e seus atos violam, mais uma vez, a Constituição Federal. Só existe um caminho para parar esse genocida: o seu impedimento. #ForaBolsonaro #ImpeachmentJa”.
A declaração na postagem vem seguida de um título de reportagem do jornal O Globo, expondo que: “’Quem decide se um povo vai viver na democracia ou na ditadura são as suas Forças Armadas’ diz Bolsonaro.”
Já a deputada federal Tereza Nelma (PSDB) também declara sua posição pública pelo impeachment do presidente. “Estamos vivendo uma grande crise de saúde e também humanitária em Manaus, e no resto do país não está diferente. Temos um presidente que não governa, nem tem competência para gerir uma Nação. Esse governo é omisso e negligente com seu povo”, disse. A psdbista prosseguiu a posição “Nesse momento, é preciso medidas urgentes para garantir mais vacinas, salvar vidas e o país, a começar pelo impeachment do presidente”.
Tendo em vista a relação de apoio mútuo com Jair Bolsonaro, foi sem muita surpresa que o deputado federal Arthur Lira (PP) declarou, por meio de assessoria, que é contra o impeachment, e que segue inteiramente concentrado em sua campanha para a Presidência da Câmara dos Deputados. Em coletiva, Lira acrescentou: “Eu já disse que impeachment não é pauta de candidato a presidente da Câmara. O presidente atual tem 50 pedidos de impeachment”.
Arthur Lira vem sendo considerado a maior aposta de Bolsonaro, tanto no próprio processo de impeachment, quanto para sua sobrevivência de base no Congresso (confira reportagem da Mídia Caeté sobre o deputado). Líder dos Progressistas na Câmara, Lira também se pronunciou em suas redes dias antes, ao defender que: “Sempre digo que ninguém pode se comprometer ou torcer por um impeachment. Ele é um remédio institucional amargo. E é fruto de uma conjunção de fatores e não uma decisão unilateral do presidente da Câmara.”
O deputado Pedro Vilela também declarou ser contrário ao impeachment. “Como operador do direito, até o momento não tenho conhecimento de ato do presidente que possa ser enquadrado na lei 1.079 – a ‘lei do impeachment’ – Assim sendo, minha posição é contrária”, informou, por meio de assessoria. O deputado Sérgio Toledo optou por declarar seu posicionamento como contrário ao impeachment, mas não quis trazer maiores explicações ou emitir qualquer declaração ao assunto. Já o deputado Severino Pessoa também se posicionou contrário ao impeachment. Segundo a assessoria , o parlamentar e seu partido Republicanos fazem parte da base de apoio ao presidente e, portanto, neste momento, não apoia essa possibilidade.
Os deputados que não quiseram responder foram Isnaldo Bulhões, que limitou-se a dizer que “no momento não há processo a ser apreciado”, e Marx Beltrão, cuja assessoria foi informada sobre o pedido, solicitou formalização via e-mail e, desde então, não emitiu mais qualquer resposta para a Mídia Caeté.
Das ruas para os placares na internet
“Sentir o clamor das ruas” é um dos critérios comumente apresentados, seja por políticos ou por analistas, para que um processo de impeachment saia da gaveta de protocolos e tenha pelo menos o primeiro ato: a apreciação do presidente da Câmara. O problema é que, em meio a uma pandemia que preconiza isolamento social, os movimentos sociais vêm buscado outras ferramentas de articulação para pressionar o Estado, o que inclui o Parlamento. No que diz respeito ao impeachment, além das carreatas que vêm mobilizando esquerda e mesmo parte da direita contra o presidente, outras movimentações online têm dado as cartas: os placares de internet.
Os portais contabilizam os supostos votos de parlamentares de acordo com suas declarações públicas a respeito, enquanto torcem para que atinja os números de 342 votos na Câmara, de modo a chegar no Senado.
Uma das iniciativas vem da página do twitter @sos_impeachment que busca, através de levantamentos efetuados nas redes sociais, mapear a posição de todos os deputados federais do país. Até este domingo, 24 de janeiro, o placar avançava com 111 congressistas favoráveis contra 75 contrários. Entretanto, até este momento, o número dos que seguem em cima do muro, sem se pronunciar, ainda estava em 325. Em um movimento junto a internautas, a mobilização é para que as pessoas na internet busquem os parlamentares cobrando uma resposta.
Quem também adotou projeto semelhante foi a União Nacional dos Estudantes (UNE), no último dia 19. A organização construiu a plataforma “Impeachment Já” cuja contabilização vai de 110 a favor e 62 que estão contrários, concluindo ainda um total de 341 que faltam se pronunciar.
Já do lado da Direita, o movimento Vem pra Rua – mesma organização que impulsionou as mobilizações pelo impeachment de Dilma Roussef (PT)- se volta agora contra o candidato que eles mesmos apoiaram com a página “Adeus Bolsonaro”.
Tendo como base os comportamentos das legendas, em grande parte dos partidos de centro e de esquerda há uma unanimidade em prol do impeachment. É o caso, até agora, dos partidos PT, PSOL, PC do B, PDT, PC do B. A situação se repete também no caso da REDE. Já os partidos com base bolsonarista mantêm a unanimidade de apoio ao presidente, como Progressistas e Republicanos. A exceção vai para o PSL que, apesar de até o momento ter os deputados majoritariamente apoiando Bolsonaro, possui sua dissidência definida. O próprio partido chegou a formalizar um dos pedidos de impeachment, em abril de 2020, protocolado pela líder da legenda na Câmara, Joice Hasselmann (SP), quando da denúncia de falsidade ideológica no registro de exoneração do então diretor geral Polícia Federal. O pedido também se baseou no que consideram evidências de intervenção nas investigações da PF e tentativa de obter informações privilegiadas.
Como quaisquer outros processos de impeachment, para além das denúncias que enquadram constitucionalmente seu viés, se delineiam no caminho motivações políticas mais complexas. Assim, a esquerda fundamenta as reivindicações pelo Fora Bolsonaro como um enfrentamento contra a retirada de direitos que se aprofunda, como por exemplo as reformas que vêm ocorrendo, ou a manutenção do Teto de Gastos, ou a legitimação da violência contra a população periférica. A reivindicação vem finalmente contra um conjunto de decisões e condutas que empurra os povos à pobreza, além da negação de outros pleitos mais históricos. Já a direita que hoje se levanta contra quem tanto apoiou coloca em questão a capacidade do presidente de aprovar ainda mais reformas, a exemplo da reforma administrativa.
Em meio à sequência de registros de pedidos, à baixa popularidade, e às investidas em atualização dos placares de contagem, a pressão social ventila a chance de destituição de Jair Bolsonaro. Resta saber até onde as movimentações pela internet inflingirão força suficiente para mobilizar a apreciação dos pedidos no Congresso, ou se as limitações do isolamento – já tão descumpridas em razão de necessidade de trabalho ou de falta de noção em festas e eleições – serão suficientes para evitar que as ruas sejam tomadas de fato em busca da derrubada de Bolsonaro.
É isso ou as mediações interpostas pelos acordos e desacordos com mídias corporativas, com o próprio Congresso, e com outras instituições e setores empresariais, se imporão a aplacar os ânimos mantendo o presidente – e seus mais de 60 pedidos de impeachment – até 2022 à frente do país.