“Aliadas na prevenção de adoecimentos e mortes, as vacinas têm a missão de proteger o corpo humano: elas ‘ensinam’ o sistema imunológico a combater vírus e bactérias que desafiam a saúde pública”.
A afirmação acima é da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Mesmo óbvia, ela precisa ser reforçada diariamente no Brasil atual, sobretudo no contexto de descredibilização das imunizações e do índice de vacinação bem abaixo do recomendado.
Levantamentos do Ministério da Saúde mostram que a cobertura vacinal brasileira está despencando. No ano passado, menos de 59% das pessoas estavam com o ciclo vacinal completo. No ano anterior, o número era de 67%, em 2019 o patamar estava em 73%. O índice deve ser de 95%.
CONFIRA NA ÍNTEGRA
Nesse contexto, recentemente a Organização Mundial de Saúde (OMS) fez um alerta muito preocupante: o risco da volta da Poliomielite (Paralisia infantil) no Brasil é considerado altíssimo.
Até metade dos anos de 1980, a doença acometia aproximadamente 100 crianças todos os dias, segundo dados da OMS. Apenas aqui no país, foram registrados quase 27 mil casos entre 1968 e 1989, ano da última notificação realizada. As Américas receberam, em 1994, o certificado de eliminação da enfermidade.
Embora totalmente erradicada, a Poliomielite vem presente no radar do Ministério da Saúde há alguns anos, principalmente pelos baixos percentuais de vacinação. Em 2021, por exemplo, menos de 70% do público-alvo foi devidamente imunizado, enquanto em 2015 o índice era de mais de 98%.
De acordo com a Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), a cobertura de imunização contra a Paralisia Infantil está na casa dos 70%, o que quer dizer que 1 milhão de crianças estão desprotegidas contra uma doença que pode trazer consequências muito graves e até mesmo matar.
COMO ESTÁ A IMUNIZAÇÃO EM ALAGOAS?
Infelizmente, Alagoas segue a mesma toada. A Mídia Caeté procurou a Secretaria Municipal de Saúde de Maceió (SMS) e a Secretaria do Estado da Saúde (Sesau) para averiguar o grau de vacinação no Estado.
A SMS, por meio da sua assessoria de imprensa, nos passou que, de janeiro a julho de 2022, o percentual acumulado de vacinação das crianças contra a Poliomielite na capital era de 64,91%. Em 2021, foi de 65% e, em 2020, de 71%.
Foram passados também os dados da Campanha Nacional de Multivacinação e Poliomielite até o dia 13/09.
– Crianças de até 1 ano
13.710 (população) // 3.563 (doses administradas) e 25,99% (cobertura)
– Crianças de 2 anos
12.692 (população) // 3.190 (doses administradas) e 25,13% de cobertura.
– Crianças de 3 anos
12.776 (população) // 3.181 (doses administradas) e 24,90% (cobertura)
– Crianças de 4 anos
12.662 (população) // 2.980 (doses recebidas) e 23,53% de cobertura.
– TOTAL
51.840 (Cobertura) // 12.914 (doses aplicadas) e 24,91% (cobertura).
Meta da campanha: 95%
Além disso, a SMS informou que a Campanha de Multivacinação e Poliomielite foi prorrogada até o dia 30 de setembro e que a iniciativa tem o objetivo de aumentar a adesão da população. Segue o posicionamento da secretaria.
A campanha [de vacinação] tem o objetivo de assegurar a ampliação das coberturas vacinais no Município e aumentar a adesão da população à vacinação, evitando tanto a reintrodução do vírus da poliomielite no Brasil – doença considerada como eliminada no país desde 1994 – quanto ao risco de transmissão de enfermidades imunopreveníveis. Paralelo à campanha contra a pólio, a Gerência de Imunização da SMS também tem intensificado o apelo aos pais e responsáveis para a atualização das demais imunizantes disponíveis no Calendário Nacional de Vacinação. A ação é voltada à proteção da saúde de crianças e adolescentes menores de 15 anos.
Já a Sesau reiterou que Alagoas também está com a Campanha de Vacinação ativa desde o dia 08 de agosto, com término previsto para o dia 30 de setembro. Até o momento, o Estado vacinou 64%, faltando 31% para alcançar a meta mínima de 95% estipulada pelo Ministério da Saúde.
O QUE DIZEM OS ESPECIALISTAS?
O presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Juarez Cunha, chama a atenção para a necessidade de vacinar as crianças contra a Poliomielite, mesmo sem existir casos notificados.
“As pessoas não lembram mais, o último caso no Brasil é de 1989, mas a polio continua ocorrendo no mundo, de forma endêmica em alguns países e com surtos em outros. Temos vacinas seguras, eficazes e gratuitas que oferecem toda a possibilidade de impedir o ressurgimento dessa doença no Brasil, mas vemos pouca adesão tanto na campanha do governo contra poliomielite como em todas as outras vacinas”, disse o presidente da SBIm à Rádio CNN.
A pediatra Mayara Líria explica que a Poliomielite tem tramitação fecal-oral, assim como por água e alimentos contaminados e reforça os riscos e que a única forma de combate é a prevenção por meio da vacina.
“A doença é causada pelo poliovírus, que se desenvolve no intestino e rapidamente afeta o sistema nervoso, podendo causar paralisia total em poucas horas, prejudicando a qualidade de vida e se tornando importante problema na saúde pública e não apenas nos infectados. A rápida transmissão/evolução, a torna muito perigosa, pois não existe um tratamento para a infecção, a melhor forma de prevenir suas sequelas, é a prevenção da infecção com a vacinação e medidas de higiene”, afirma a pediatra.
Mayara lembra que o perigo não é individual e sim coletivo, por conta da facilidade de transmissão.
“Quando uma criança não se vacina, ela não está em risco isoladamente, ela se torna um risco para os demais ao seu redor, pelo risco de transmissão. Por isso é primordial conscientizar, estimular e cobrar as famílias para que não deixem de vacinar seus pequenos”, alerta.
A médica acredita que as recorrentes falas e campanhas que questionam a eficiência da vacinação (sobretudo em relação à Covid-19) contribuem para a baixa adesão em todo o país.
“Infelizmente o jogo político atual, a situação de pandemia e tudo que girou em torno da negação da doença e a tentativa de descredibilizar a vacina contra Covid, refletiu fortemente nas demais vacinas. Fomos por muito tempo reconhecidos pelo nosso programa de imunização e nossa cobertura vacinal, o que era motivo de orgulho para a população brasileira. Hoje, diante de tanta manipulação política, passou a se questionar a eficácia das demais vacinas, a tanto estabelecidas e comprovadamente eficazes. Acarretando no retorno de doenças tidas como erradicadas e levando a risco de endemias ou até pior”, comenta.
A pediatra Mayara Líria crê também que outras doenças erradicadas podem, como consequência, voltar se esse pensamento continuar.
“Já temos visto isso acontecer com o sarampo, que havia sido considerado erradicado em 2016 e que novamente temos visto o aparecimento de casos em nosso meio. Esse retorno de doenças é preocupante não só nas erradicadas, mas também nas que hoje estão controladas, por exemplo o risco de aumento de doenças para as quais a vacinação precisa ser reforçada/renovada periodicamente – como o tétano que antes era tão frequente e hoje pouco se vê”.
A imunização contra a Paralisia Infantil é realizada por meio de três doses injetáveis, intercaladas aos dois, quatro e seis meses de idade, além de mais duas doses complementares por gotas até os cinco anos.