Não bastasse a crise vivida pelos rodoviários na luta pelo pagamento do ticket alimentação, plano de saúde, aumento salarial e até decisão judicial considerando abusiva greve ameaçada pela categoria, os rodoviários enxergam como iminente a extinção da função de cobrador de ônibus na capital alagoana. Desde a decisão proferida pela 4ª turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) em novembro de 2020, a categoria se sente ameaçada, mas a modernização do uso do cartão Bem Legal e a crise do setor aprofundada no período pandêmico dão como certo o fim da profissão em curto prazo.
No entendimento do TST, os ministros reconheceram a possibilidade de acumulação de função dos motoristas. No mesmo ano, o Sindicato de Transporte Urbano de Passageiros do Maceió (Sinturb) deu início a um plano de desligamento voluntário (PDV). Apesar do claro indício de que a categoria foi enfraquecida pela decisão do Tribunal, o presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários no Estado de Alagoas (Sinttro/AL), Sandro Régis, alega que foi o projeto de Lei 7.480/2021, de autoria do atual presidente da Câmara de Maceió, Galba Novaes Netto (MDB), que teria acelerado o processo de demissão dos cobrados na capital e que desde a derrubada do veto em plenário, há menos de um mês, 100 novos cobradores foram demitidos. O PL chegou a ser vetado pelo atual prefeito de Maceió, João Henrique Caldas (PSB), mas foi derrubado por 17 votos a 8, no dia 24 de março do corrente ano.
Sandro Régis, do Sinttro/AL, alega que a derrubada do veto estimulou as demissões em massa na capital alagoana e diz não acreditar que a decisão do TST tenha legitimado mais a decisão dos empresários do que o PL , embora este ainda não tenha sido promulgado, e critica o modo como os trabalhadores estão sendo afastados de suas funções. “Na verdade, os empresários não se posicionaram. As demissões aos montes estão acontecendo desde que o veto foi derrubado, sem conversa prévia com os cobradores. Eles apenas estão sendo colocados para fora,” alega Régis, que afirmou ter tentado contato com o autor do projeto para buscar uma solução, sem sucesso.
O vereador chegou a se pronunciar em outras oportunidades à veículos de comunicação locais, alegando que a ideia surgiu durante o período da pandemia e que o texto original da matéria era evitar a circulação de papel moeda, apontada pelo parlamentar como uma das formas de contaminação do Coronavírus. Como Maceió possui o sistema do Cartão Bem Legal, O PL prevê a adoção dos cartões pelos maceioenses e também por turistas.
Ainda sobre o PL, o vereador alega que a decisão do TST resultou na adaptação do projeto. “Para que ele não tivesse vício de iniciativa e morresse na comissão. Obrigamos as empresas a fazer a capacitação e acolher esse funcionário em uma outra função, porque hoje eles estão sendo demitidos sumariamente, sem nenhum tipo de regulamentação. Então a legislação, ela veio para trazer obrigações as empresas que hoje estão vedando o acesso do usuário. Não estão fornecendo acesso ao cartão Bem Legal, estão cobrando por esse cartão, ganhando duas vezes,” disse Galba Netto durante sessão em que defendia a derrubada do veto.
O texto original e a redação final do PL obrigam as empresas a oferecerem aos cobradores oportunidade gratuita de formação profissional com a finalidade de realocá-lo, mas não trata da obrigação numérica ou percentual desse reúso.
Art. 1º Os motoristas de ônibus que operam no sistema de
transportes urbanos no município de Maceió, em razão da sua
atividade complementar, poderão, cumulativamente, exercer
atividades as atividades relacionadas a de cobradores.
§1° As empresas prestadoras do serviço de transporte
municipal de ônibus disponibilizarão àqueles colaboradores que
ocupam a função de cobrador, oportunidade gratuita de formação
profissional pelo Serviço Social do Transporte – SEST e/ou Serviço
Nacional de Aprendizagem do Transporte, com a finalidade de
realocá-los para novas atividades.
§2° O §1° não se aplica aos cobradores que, no curso do
período desta lei, praticar falta grave que justifique a sua demissão,
nos moldes estabelecidos na Consolidação das Leis Trabalhista –
CLT.
O Sinturb se recusou a fornecer os dados de quantos profissionais foram reaproveitados e de quantos cobradores já foram demitidos. Informou apenas que 60 já teriam se formado no programa de profissionalização para motoristas, que outros 50 devem concluir o curso em abril, e que a expectativa é formar 200 motoristas. Mas não informou quantos deste foram reaproveitados pelas empresas.
Sobre as demissões, o Sinturb negou que tenha relação com o PL de Galba Netto, e apresentou outros fatores, diferentes inclusive da decisão do TST, para justificar as demissões:
“Qualquer desligamento nas empresas acontece devido ao fim da ajuda do Governo Federal na redução das jornadas e à perda de receita devido à queda no número de passageiros durante a pandemia, e não tem relação com o Projeto de Lei 7.480/2021, mas com uma adequação do quadro de funcionários à realidade econômico-financeira vivida pelas empresas. O Sinturb reitera também que as empresas de ônibus de Maceió criaram um plano de desligamento voluntário (PDV) ainda em 2020, com alguns benefícios para os funcionários que optam pela adesão,” diz a nota.
O Sinturb também não quis comentar sobre a fala do presidente do Sinttro sobre o ‘momento delicado’ para as demissões, em referência à pandemia.
Nesse jogo de empurra, enquanto não ficam claras as razões das demissões, os cobradores seguem sendo afastados de suas atividades, juntando-se à lista dos mais de 14,3 milhões de desempregados no Brasil.