A doação de 304 prédios de escolas públicas para o Fundo Garantidor da Alagoas Previdência (FGAP/AL), decidida pelo Governo do Estado a partir da aprovação da Lei 8759 de novembro de 2022, colocará em risco o ensino público, abrindo espaço para maiores inserções de parceria público-privada, e consequente processo de privatização do ensino público. É essa a maior crítica levantada pelo chamado Manifesto Alagoano em Defesa da Escola Pública, que reúne a assinatura de integrantes da comunidade escolar junto a entidades estudantis, sindicais e de trabalhadores, que compunham o Comitê Alagoano em Defesa da Escola Pública.
Mobilizados em prol da revogação da Lei que instituiu o Fundo Garantidor – com recursos dos prédios públicos – os signatários do manifesto denunciam que, a partir do que identificam como um processo de privatização, as escolas passam agora a se transformar em patrimônio do Alagoas Previdência, de modo a se desligarem da estrutura do Estado. A partir dessa doação, o governo terá que pagar pelo aluguel das escolas e também passará a depender de parcerias com setor privado para estabelecer planejamento, e execução e avaliação das atividades da escola, sejam elas administrativas, financeiras, ou as pedagógicas.
A relação é estabelecida com mais detalhes no Artigo 5º do documento, ao definir que “ É facultada à ALAGOAS PREVIDÊNCIA a constituição de fundos de investimento imobiliários e sociedades de propósito específico para rentabilização ou monetização de seus ativos.
§ 1º Fica assegurada à ALAGOAS PREVIDÊNCIA a participação ativa no planejamento, na discussão e na execução de concessões e cessões de bens e serviços, especialmente sob a condição de Parcerias Público-Privadas, bem como nos casos de alienação dos ativos do FGAP/AL.
§ 2º A ALAGOAS PREVIDÊNCIA deve constituir setor técnico próprio que acompanhe a gestão dos ativos não financeiros do FGAP/AL.
§ 3º A ALAGOAS PREVIDÊNCIA deve elaborar, trimestralmente, relatório técnico avaliando a gestão patrimonial e financeira do FGAP/AL, encaminhando o resultado para apreciação dos seus Conselhos.”
O manifesto ainda critica o fato de que a população – ou ao menos os setores diretamente envolvidos – sequer chegaram a ser consultados para adoção da medida.
“Com efeito, o governo, equivocadamente, PUNE toda a comunidade escolar com essa medida ao doar as escolas a um fundo previdenciário sem realizar a forma mais comum, que é a consulta pública àqueles que mais precisam desse patrimônio público, os trabalhadores alagoanos”, descreve. “O governo, de forma antidemocrática, delineia um outro tipo de ‘arranjo educacional’ que se distancia dos reais interesses da classe trabalhadora e se aproximando de interesses capitalistas com uma visão estreita de educação”, complementa.
Ainda segundo o Comitê, essa situação deverá impactar de forma direta trabalhadores da educação e estudantes, que não terão garantias sobre direitos e condições de trabalho. “A verba pública tem que ser destinada em benefício das escolas e não ser desviada para pagar aluguel das escolas que são públicas e patrimônio dos alagoanos”, reforçam.
Aprovada em 25 de novembro de 2022, a Lei 8759 foi encaminhada a partir de Projeto de Lei do Governo do Estado, sob alegação de “de manter no Fundo Previdenciário recursos superiores à matemática calculada para garantir o direito dos servidores”. Embora o Estado utilize frequentemente o argumento de que se trata de manter mecanismo de segurança adicional a um fundo já “superavitário” do Estado, o Sindicato dos Trabalhadores da Educação (Sinteal) respondeu que a Lei – à época um PL – tinha por objetivo cobrir o rombo do AL Previdência a partir da venda das escolas.
No dia 21 de dezembro, o Sindicato dos Trabalhadores da Educação de Alagoas (Sinteal) organizou um ato público para cobrar explicações a respeito da Lei, e não poupou questionamentos, divulgados no portal do Sindicato. Na oportunidade, o presidente do Sinteal anunciou: “É necessário que o governo e o AL Previdência convoquem os trabalhadores e as trabalhadoras para explicar o que querem, de fato, fazer com o fundo previdenciário. Qual é o real objetivo disso? A quem ele beneficia? Não iremos descansar até compreender, rever e reverter esse processo. O nosso patrimônio foi entregue para o mercado financeiro, sem qualquer controle social”. Mais à frente, prosseguiu com ainda mais perguntas: “Quais são os negócios jurídicos mencionados no artigo 2º da lei? Requeremos cópias dos contratos, aditivos, escrituras públicas, pareceres jurídicos e técnicos?”
Privatização das escolas vêm acontecendo nacionalmente
Em meio a particularidades e diversidades circunstanciais e formais, vem sendo crescendo o movimento de privatização de escolas públicas estaduais e municipais em todo o país, abrindo espaço para que grupos empresariais queiram abocanhar orçamentos públicos, a exemplo do FUNDEB, e interferir pedagógica e institucionalmente em instituições de ensino públicas.
Não à toa, o Sindicato de Trabalhadores da Educação do Distrito Federal registra alguns casos. Cerca de um mês antes, o governador do Paraná, Ratinho Júnior (PSD) iniciou abertura para que empresários pudessem gerenciar 27 escolas estaduais, sob pretexto de que seriam aquelas cujo IDEB possuiu nota baixa. Em São Paulo, o Projeto de Lei 573/21 também abriu espaço para iniciativa privada gerenciar escolas públicas do Município.