PL do Dia do Nascituro: discussão tem boneco de feto, ofensa a feministas, e termina com pedido de vistas

Se aprovado, PL permite que Município realize campanhas contra aborto - inclusive em casos previstos em lei

 

Durante o que seria o segundo dia da discussão sobre o Projeto de Lei (PL) que visa estabelecer o “Dia do Nascituro” e a “Semana da Vida”, o vereador Leonardo Dias (PSD) e a vereadora Gaby Ronalsa (DEM) proferiram – nas oratórias – uma série de ofensas contra feministas, entidades civis e movimentos sociais que questionaram o PL. Afirmando ter enfrentado ameaças e hostilizações em razão de sua proposta, e recebendo apoio dos colegas da Casa, Ronalsa também chegou a fazer uso de um boneco de bebê ilustrando ‘nascituros’, alegou que houve falta de entendimento sobre o objeto do seu PL, além de desinformação e reproduções como ‘papagaio’.  Antes de ser votado, no entanto, o documento recebeu pedido de vistas  por 72 horas por parte do vereador Dr. Valmir (PT).

Se aprovado, o documento dota ao município a possibilidade de realizar campanhas contra o aborto – incluindo casos previstos em lei em escolas, postos de saúde e diversos outros espaços públicos da capital alagoana, uma vez que prevê campanhas pela defesa à vida do estatuto “sob qualquer circunstância”. Apesar disso, os defensores da pauta negam esta causalidade, alegando que não há a palavra ‘aborto’ no documento.

Gaby Ronalsa recebeu uma série de apoios dos pares em razão das ameaças sofridas. Durante o debate sobre o projeto, o vereador Cleber Costa (PSB) reforçou que não apóia o repúdio a alguém em decorrência de suas ideias seja qual lado for. “Sou obrigado a repudiar quando o vereador Leonardo Dias coloca sobre a esquerda. Não me interessa quem é esquerda ou direita. Não me rotulo de esquerda ou direita. Discuto no campo das ideias”.

Em seguida, Costa colocou a problematização em torno da possibilidade de buscar entidades para campanhas em qualquer circunstância. “A gente não pode admitir em todas as circunstâncias que se pode defender o nascituro. É uma discussão muito antiga e até na própria igreja já teve disputas”.

O debate não prosseguiu, em razão do pedido de vistas solicitado por dr. Valmir (PT). Apesar de não ter prosseguido a segunda discussão, um debate já havia sido iniciado antes, ainda durante a oratórias iniciais.

Ofensas, uso de bonecos para ilustrar nascituros e acusações de apoio à pedofilia

Primeiro orador inscrito, Leonardo Dias começou sua fala proferindo uma série de ofensas às entidades que confrontaram o projeto, afirmando que os movimentos de esquerda promoviam uma ‘ tática de espantalho’ publicizando debates que não estavam inseridos no PL ou disseminando que o ele teria como objetivo rever a Constituição. Por fim, chegou a a associar as pessoas contrárias ao projeto como “da mesma turma de quem defende a pedofilia”, ao defender Ronalsa – que teria recebido essa acusação.

“Quem defende a pedofilia, na verdade, são aqueles que defendem peças teatrais onde crianças são obrigadas a tocar em pessoas nuas. Onde crianças levadas a interagir com homem nu. E essa mesma turma que defende isso é a que está contra o projeto. É essa mesma turma que releva e defende vagabundo, bandido, quando é preso, e está agora revoltada com um projeto de lei que visa educar nossas crianças a importância da vida, o direito da vida”.

Após criticar o ‘espantalho’, o vereador seguiu a proferir exatamente suas ideias contra o direito ao aborto, descrevendo vídeos que assistiu na internet com detalhes sanguinários de ‘cabeças esmagadas’ e ‘braços arrancados’. Ao fim, no entanto, retomou com a ideia de que o PL não se tratava disso.

Gaby Ronalsa também abriu sua oratória lendo que iria desmistificar e desfazer ‘mentiras inventadas’. Durante sua fala, a vereadora repetiu que o Projeto de Lei não foi lido pelos críticos ou foi reproduzido a partir de “fake news”. Ronalsa também criticou as acusações de que seria machista.

“Alegaram que eu era machista, que meu PL tinha cunho machista, e que seria contrário ao direito da mulher.  Eu sou totalmente contra o machismo, assim como não compactuo com o ‘feminismo radical’. Na realidade, sou contra qualquer radicalismo”. Segundo ela, no feminismo ‘radical, as mulheres “não lutam pela igualdade e equidade, e sim pela soberania e exclusão dos homens, e isso não é justiça, isso é equiparar a atitudes egoístas e mesquinhas que tanto abomino. Agora expor com humilhações e zombaria na rede social é ser feminista? É defender que direito da mulher?”

Ao defender a constitucionalidade do PL, Ronalsa usou como argumento o fato de ter sido aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa, além da Comissão de Higiene, Saúde Pública e Assistência Social. Também acrescentou ter o mesmo objeto a Lei Estadual 8127/19 do deputado Dudu Ronalsa.

“Sabe o que é engraçado, Léo, que quando houve a discussão desta lei no âmbito estadual, em vigência há dois anos, não houve essa repercussão nem esse ‘impacto negativo’, ninguém alegou inconstitucionalidade nenhuma até hoje apresentaram ADI”, acrescentou. “Então por que será que na seara municipal está causando tanto tumulto, tantas notas de repúdio? Notas essas de pessoas tão esclarecidas?’

Finalmente, negou a referência ao aborto, justificando não ter a referida palavra dentro de todo o projeto. Entretanto, evitou ler todos os termos colocados no projeto em que explicita o “direito do nascituro à vida em todas as circunstâncias”. Com um boneco na mão, o que era nascituro. “Nascituro é o ser humano. Um feto para alguns. Para mim, um bebê que tem vida intra-uterina, ou seja, aquele que foi concebido mas ainda não nasceu”.

A vereadora também utilizou ironia em confronto a movimentos e coletivos feministas que questionaram sua constitucionalidade e denunciou ter sofrido hostilizações, ameaças e uma série de calúnias em razão de seu PL.

“Infelizmente por pura arrogância e reprodução errônea, muitos distorcem o que nem leram. Eu nem ia tratar do tema aborto , mas como colocaram o tema vou passar a me manifestar.  Reforço que meu PL, em nenhum momento, visa legislar sobre o aborto, até porque eu como vereadora não tenho competência para isso, nem nenhum dos 25. Não posso alterar lei federal e nem esse é o objetivo do PL”.

Em seguida, assim como Leonardo Dias, se debruçou a falar sobre o aborto enquanto crime, reiterando que a legislação prevê que o aborto provocado é crime em todos os casos, embora alguns deles não sejam passíveis de punição, citando os casos de risco à gestante e gestação resultante de estupro.

“Como advogada não posso aceitar que tenham ignorado os dispositivos contidos no corpo do projeto e tenham focado na justificativa, porque – em quase 13 anos de exercício jurídico – confesso que nunca vi isso. Mas prefiro acreditar que não viram meu PL e só saíram reproduzindo como papagaios. Para essas pessoas, eu faço questão de explicar, como se explica a um bebezinho”.

Vereadores, então candidatos, comprometidos com programa “Legisladores pela Vida”

Teca Nelma: Aprovação no CCJ não significa constitucionalidade

Após os colegas anteciparem o debate, Teca Nelma (PSDB) também decidiu utilizar seu tempo de oratória, discordando de Leonardo Dias e Gaby Ronalsa. “Acho que quando a vereadora trata de ‘arrogância’, ‘doutores da lei’ e bebezinhos que precisam saber o que é lógica, quando fala que é preciso dar uma lidinha e precisa explicar melhor, ela fala diretamente com o povo de Maceió e o povo de Maceió não merece isso. O povo merece políticas públicas, PLs que tratem diretamente do povo, que mereçam ser incluídos nessa câmara municipal e que tratem dos maceioenses enquanto um povo. A gente não tem aqui vereadores de um bairro, de local ou grupo específico. somos eleitos pra sermos vereadores de Maceió. Quando a gente propõe projetos inconstitucionais como esse, não temos isso”.

Teca Nelma acrescenta ainda que há falta de acesso das minorias, incluindo na Câmara onde há quatro mulheres vereadoras. “E fico triste quando só há quatro mulheres e uma delas vêm a plenário para falar que feminismo radical é contra o direito do homem, porque isso é inverdade. Na verdade, a gente chama isso de femismo”, disse.

A vereadora psdbista também reforçou que a aprovação na CCJ não significa sua constitucionalidade, acrescentando ainda ter sido voto contrário. “Tenho muito orgulho de ser a única vereadora da CCJ que se ateve à Constituição Federal e foi contra esse PL.  Tenho total noção porque li o projeto inteiro. E, além de ler o PL inteiro, também li a justificativa. Se a vossa excelência nunca viu em 14 anos de doutora da OAB que a justificativa nunca foi lida, fico muito triste”, comenta.

Também rebateu sobre desinformação. “Há na Casa esse movimento de falseamento das informações. Só foi lido um parágrafo do PL e faço questão de ler o parágrafo em que eu falo que é inconstitucional”, diz. “Não é falta de interpretação de texto quando diz aqui ‘em qualquer circunstância’.

Segundo a legisladora, a constitucionalidade do projeto ainda é discutível. “Não é porque foi cometido o erro no Estado que temos que cometer o mesmo erro no Município. Nem é porque ele passou na CCJ, que não fere a Constituição. Temos exemplos de projetos votados aqui, como a alteração do nome da Praça Dandara, que todos aqui sabemos que os vereadores não seguiram a CF e temos inclusive processo na Justiça contra a lei porque os vereadores não seguiram”.

Finalmente, lamentou a agressividade dos vereadores contra mulheres que se pronunciaram contra o PL, no âmbito da sociedade civil. “Para mim, fico muito triste que tenha tanta agressividade para um debate e palavras agressivas, quando a gente não se propõe a fazer uma audiência pública, que estou há seis meses cobrando, quando a gente não traz movimentos feministas ou de mulheres”. Por fim, leu uma carta de movimentos sociais.

A Mídia Caeté produziu uma reportagem trazendo todos os detalhes sobre o PL, a dinâmica em que estes projetos vêm sendo produzidos e reproduzidos de forma bastante similar por todo o país, e sua origem através da CNBB e de movimentos pró-vida que seguem sob liderança da atual ministra Damares Alves. Esses PLs integram, ainda, critérios para políticos que integram o programa ‘Legisladores pela Vida’, com a qual Gaby Ronalsa e Leonardo Dias fazem parte.

A reportagem também traz debates levantados por profissionais e especialistas que alertaram como este PL abre o caminho para legitimar ideologicamente o Estatuto do Nascituro. Confira a reportagem completa aqui.

Em nenhuma das declarações, cartas de repúdio ou documentos apresentados, há qualquer alusão dos movimentos feministas sobre o PL pretender “mudar a legislação da CF”, mas apresentam críticas contínuas à realização das campanhas que promoverão hostilização aos casos em que mulheres realizam aborto previsto em lei, como vítimas de estupro, gestantes sob risco e – conforme determinação do Supremo Tribunal Federal (STF) – também de fetos anencéfalos. As críticas são aportadas com base nos dados que demonstram a realidade das meninas e mulheres vítimas de violência sexual, e diversas outras questões relacionadas à saúde da mulher e aos direitos reprodutivos vigentes.

Primeira Discussão: vida das mulheres, educação sexual e inconstitucionalidade

Durante o primeiro dia de sessão, Gaby Ronalsa não se pronunciou, em razão de falhas na internet, de modo que coube ao vereador Leonardo Dias – que também integra o grupo dos “Legisladores pela Vida” – iniciar as falas em apoio à autora do projeto. “Milhões de vidas são ceifadas através do aborto em todo o mundo. No Brasil não é diferente. Eu como ‘pró-vida’, assim como a vereadora Gaby Ronalsa, a gente defende que desde a concepção já é uma vida, porque se aguardar dali não sai outra coisa a não ser um humano”, defendeu.

Na sequência, o vereador Cleber Costa – que emitiu parecer favorável ao Projeto de Lei, enquanto relator da Comissão de Saúde da Câmara – desta vez apresentou contrariedade ao PL. Inicialmente apresentando pontos favoráveis como as ações de prevenção à gravidez, também apresentou seu contraponto. “O que a gente não pode é determinar que, em função da defesa do nascituro, a gente prive a mulher do direito de decidir o que ela pode fazer em relação ao seu corpo”, relatou.

Neste sentido, Costa relembrou o caso da criança de dez anos que foi estuprada e enfrentou uma verdadeira via crucis para fazer garantir o procedimento abortivo, mesmo garantido por lei em decorrência da gestação de risco e de ser resultante de estupro. “A gente precisa ter discussão mais aberta com a população. Sou contra o aborto, mas entendo que o Estado é laico. Não posso obrigar as pessoas ao que elas devem fazer. A decisão é individual e cada um deve ter sua maneira de ver e direito de opinar, não obrigar. Como católico, não posso obrigar as pessoas a não abortarem porque é contra a vida”, disse.

Cleber Costa ainda apontou a contradição com a preceitos da legislação e dos direitos das mulheres. “O direito civil determina que a pessoa só tem direito quando nasce”, relata. “Tem a questão de matar o feto, mas a gente está vendo só o lado do feto e esquecendo o lado da mulher. Como pessoa humana, ela tem todo o direito de definir o que fazer com o corpo dela. A gente vive num estado machista” argumentou.

Costa também relembra os casos de aborto previstos em lei. “ A lei determina aborto em casos de fetos anencéfalos, risco de vida da mulher gestante, e por estupro. Essas situações não têm mais o que discutir. Aceito o que a lei determina porque ela atende a população em geral. Posso não concordar por ser católico, mas eu sou um segmento da sociedade e não posso impor o meu modo de pensar. Entendo que a gente carece de mais discussão aberta, plena e republicana do assunto, abrangendo todos os segmentos da sociedade”.

Também com posição contrária ao PL, a vereadora Olívia Tenório (MDB) refletiu sobre o cuidado com a saúde mental as mulheres. “Eu sou pró-vida do feto, sim, mas também sou pró-vida da mãe”, reforça, também utilizando o exemplo da criança violentada. “Ela tinha chances gravíssimas de falecer no decorrer da gestação porque o corpo não estava preparado. E além do risco para a saúde dela, o caso de estupro – dois motivos em que ela poderia legalmente abortar – e mesmo assim o médico foi chamado de assassino e a criança foi hostilizada. E a gente, que é pró-vida, por que não é pró-vida dessa criança também?”, questiona.

Tenório  a perspectiva das mulheres que sofrem com gestações de fetos anencéfalos. “Imagina o sofrimento de uma mãe que sabe que o feto vai nascer sem perspectiva de vida e, se viver, será por poucas horas. E ela não poder abortar e ter que passar toda uma gestação sabendo que é sem futuro, como toda a parte psicológica dessa mulher ficará abalada?”, acrescenta.

“O receio que me causa é a gente mais uma vez estar hostilizando e apontando o dedo para quem toma uma decisão diferente da nossa. Eu estou grávida e não tenho nem nunca tive, antes da gestação, pretensão de abortar ou algo do gênero, mas isso não me dá o direito de apontar o dedo na cara de alguém que toma decisão diferente da minha. Acredito que se a gente é pro-vida, tem que ser pró-vida de todos e não de quem a gente acha que merece ou não viver, receber educação. Por isso me preocupo com esse projeto porque aumenta o dano psicológico a uma mulher”.

Teca Nelma iniciou a justificativa de seu voto contrário com lamento. “Mais uma vez, na Câmara dos Vereadores, estamos votando um projeto inconstitucional”. A vereadora faz uma crítica sobre o vínculo do projeto com a Igreja Católica. “Apesar de vivermos um estado laico, o PL deixa explícito que o Dia do Nascituro e a semana da vida são datas instituídas pela Igreja Católica, o que já exclui e desconsidera a pluralidade das mais diversas crenças e práticas religiosas, e não leva em conta as particularidades de cada aluno e aluna das escolas onde serão desenvolvidas as palestras. Vale salientar que esses alunos estão numa fase da vida em que se é vulnerável em posições religiosas”.

Prossegue, ainda, trazendo informações que demonstram o contexto de vítimas de violência sexual que serão submetidas às “campanhas pró-vida”.  “Dados apontam que são as meninas as maiores vítimas de estupro no estado de Alagoas; 76% [dos casos de] violência sexual foram contra crianças e adolescentes e Maceió concentra 48% dos casos. Na imensa maioria das vítimas, o abuso acontece dentro da própria residência da vítima, o que nos garante que essas meninas não estarão dentro das salas de aula sendo revitimizadas por aborto e ouvindo palestra sobre como isso é reprovável ou repugnável? É um claro atentado à dignidade das meninas”.

A crítica se estende à resistência da Câmara em abrir debate sobre educação sexual e reprodutiva. “Isso sim contribuiria para que se identifiquem as violências sofridas diariamente.  Nesta Câmara Municipal existe um tabu muito grande quando se coloca educação sexual em qualquer PL. Digo isso por experiência própria com o projeto do Dia da Menina que está há praticamente seis meses rolando nessa casa”, cobra. “Estas meninas estão sendo vitimizadas todos os dias. Enquanto a gente se nega a debater, esses processos violentos continuam ocorrendo. Al
E ainda pensar políticas públicas que lhes permitam vidas livres de violência”. Projetos como este [Dia do Nascituro] não pensam na mulher maceioense e, mais uma vez, fico muito triste de ver que a Câmara aprova um PL como este, inconstitucional e contra as mulheres”.

Vereador Dr. Valmir e a trajetória até o pedido de vistas

Quem também manifestou contrariedade a aspectos do PL foi o vereador Dr. Valmir (PT). Durante a plenária, questionou se o projeto municipal não cometeria uma tentativa de sobrepujar a legislação federal, ao propagar a criminalização de aborto em casos já previstos em lei. “Considero que é muito importante a gente fazer essa defesa da vida. Agora é evidente que a gente precisa ter cuidado na elaboração dos projetos para que eles não possam ferir a Constituição Federal e as normas do Código Penal”, diz. “Que tenha cuidado de naõ interferir com uma lei municipal que termina suplantando a legislação. Ela não pode ultrapassar a legislação federal”, comentou.

Apesar dos apontamentos, no momento da votação, o vereador não levantou a mão – gesto utilizado durante as sessões online da Câmara para manifestar voto contrário às respectivas matérias. Momentos depois, apresentou à mesa a reivindicação para que a mesa encaminhasse à procuradoria uma avaliação sobre se o projeto estaria ferindo uma norma federal .

Entretanto, recebeu a resposta do presidente da Casa, vereador Galba Netto, de que o PL já passou pela comissão de Constituição e Justiça e Redação Final e de que o momento para questionar à Comissão, bem como atentar para a inconstitucionalidade deveria ter ocorrido antes da votação. “No momento da votação, poderia ter pedido vistas, e poderia individualmente dentro de sua prerrogativas fazer esses questionamentos tanto à procuradoria, quanto à própria comissão, mas agora já não cabe mais essa situação. A gente pode ficar atento, mas como disse, tenho certeza de que deve ter sido avaliado pelas comissões. Não é uma avaliação de plenário nem da mesa diretora. Ele terá a segunda discussão e o senhor poderá fazer isso na oportunidade da segunda discussão e contará com nosso apoio para deferir o pedido, caso vossa excelência entenda dessa forma”, relatou.

Após a sessão, Doutor Valmir gravou uma vídeo em suas redes sociais relatando que seu voto não foi computado, e que pediria vistas sobre o PL nesta quinta-feira, 17, quando ocorrerá a segunda discussão da matéria.  Em razão do PL ter sido adiado, por problemas de acesso à internet, o pedido de vistas foi efetivamente feito nesta terça, 21.

Associação e entidades enviam manifestação de repúdio

Ainda entre estes dias 16 e 17 de junho, diversas entidades manifestaram repúdio em uma série de notas. Apesar do que foi dito pelos vereadores Dias e Ronalsa, nenhuma delas sugeriu que o objeto do PL seria legislar sobre aborto – e sim sobre as campanhas  relacionadas ao tema.

O Núcleo Carmim de Feminismo Jurídico lançou uma cartilha online intitulada “Porque o PL 11/2021 que institui o Dia do Nascituro e a Semana da Vida é inconstitucional e uma Ofensa ao Direito das Meninas”. Além de apresentarem o vínculo de uma religião específica no projeto, reforçam as consequências das campanhas em escolas, diante do estado vulnerável das meninas, e da revitimização cometida contra vítimas de violência sexual que tenham praticado aborto previsto em lei.

“São crianças que tiveram o corpo violentado, ao passo em que parte destas pode ter engravidado e sido submetida a um aborto legal. Imaginemos essas mesmas crianças recebendo palestras sobre o “A vida do nascituro” e a “Semana da vida”, escutando palavras de reprovação ao aborto que fizeram ou poderão fazer sob o fundamento de que se trata de um pecado, ainda que tenha sido produto de um estupro, muitas vezes cometidos
dentro de suas casas.” Confira a cartilha na íntegra

Já uma outra nota enviada por dezenas de entidades, partidos, sindicatos, também foi publicada sob o título: “Em Defesa do Estado Laico e da Dignidade das Meninas”. O conteúdo da nota, que você pode ler na íntegra clicando aqui, aponta ainda como este projeto pode entrar em contradição ao fragilizar ações mais consistentes de políticas de defesa da vida de meninas e mulheres. “As escolas municipais atendem prioritariamente Educação Infantil e Ensino Fundamental. Para tratar da prevenção ao abuso e violência sexual contra crianças e adolescentes é necessário criar programas com equipes técnicas da Educação e Saúde, com pedagogas, psicopedagogas, psicólogas, assistentes sociais, inclusive porque a legislação nacional determina que as escolas façam parte da rede de proteção às crianças, identificando e denunciando casos de violência”. Confira a nota na íntegra.

Finalmente, ADUFAL, SINTUFAL, SINTIETFAL e SINTEAL também emitiram uma nota técnica sobre o PL 11/2021 em que se debruçaram sobre o Projeto a partir de sua perspectiva legal. Começa analisando a relação entre Estado e Religião conforme a CF, analisando que se fere o princípio de separação. Em seguida, parte para analisar a competência para legislar sobre a educação nacional.

“Caberia, pois, se avaliar se o PL 11/2021 em análise na Câmara Municipal de Maceió se adequa às definições de norma complementar, e de Parte Diversificada do currículo das escolas de Educação Básica da rede pública municipal. E a resposta é negativa, visto que é vedado o proselitismo religioso na educação. Percebe-se, também, que os conteúdos propostos pelo PL 11/2011 conflitam com as orientações nacionais para organização curricular e não se coadunam com as competências gerais, expressão dos direitos e objetivos de aprendizagem e desenvolvimento, a serem desenvolvidas pelos estudantes, expressas na BNCC.”

Os órgãos se voltam a analisar a matéria. Concluindo que: “Observa-se, pois que há no projeto em questão a pretensão de utilizar a Escola Pública, um direito público subjetivo, em canal de transmissão de doutrina religiosa, o que a legislação educacional nacional não permite. Desta forma, nosso entendimento é que o projeto em análise na Câmara Municipal de Maceió, PL 11/2021 é inconstitucional e entra em conflito com a legislação educacional do país. Recomendamos ao Plenário que rejeite o citado projeto.” Leia aqui a nota técnica na íntegra. 

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