Resumo
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Lançado desde dezembro de 2023, o Plano Nacional Ruas Visíveis despertou expectativas em todo o país de que políticas públicas voltadas à População em Situação de Rua passassem do papel e se estruturassem- como deve ser – a partir de um plano de ação, com monitoramento e resultados concretos. De iniciativa do Governo Federal, o Plano recebe adesão voluntária de estados e municípios, que – ao decidirem ser signatários – passam a se comprometer com a efetivação da Política Nacional para a População em Situação de Rua. Diante da ausência de iniciativa da Prefeitura de Maceió sobre adesão ao Plano, o Comitê Pop Rua/Jus encaminhou um ofício questionando se haverá ou não a adesão, solicitando também uma justificativa para que ela não aconteça.
A preocupação em relação ao silenciamento da gestão municipal se dá em razão das próprias condições crescentes de vulnerabilidade enfrentadas pelas pessoas em trajetória de rua: são cerca de 5 mil pessoas convivendo com essa condição, só em Maceió, de acordo com estimativas do Movimento Nacional da População em Situação de Rua (MNPR).
De acordo com o secretário executivo do Comitê Pop Rua Jus, defensor público Isaac Souto, essas condições têm mobilizado o Comitê Pop Rua Jus, instância criada em Portaria Conjunta que reúne, desde 2023, representantes do sistema de justiça, e sociedade civil organizada, para construir soluções que garantam o acesso a direitos e políticas públicas às pessoas que enfrentam essas condições extremas de vulnerabilidade.
“Diante desse cenário, o Comitê Pop Rua/Jus manifestou sua preocupação ao poder público municipal, destacando a necessidade de ações concretas e eficazes para garantir os direitos fundamentais dessa população”, explica. “O plano conta com 99 ações intersetoriais para a efetivação da Política Nacional para a População em Situação de Rua (PNPSR), estabelecida pelo Decreto nº 7.053/2009”.
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Para o secretário executivo do Comitê, a adesão ao PNRV representa uma oportunidade para que Maceió reafirme seu compromisso com a dignidade da pessoa humana, “promovendo políticas públicas integradas que garantam assistência, saúde, moradia e inclusão social para essa população. Como o Estado de Alagoas já formalizou sua adesão ao plano, torna-se ainda mais essencial que a capital siga essa iniciativa, ampliando as ações de proteção e garantindo respostas efetivas para essa grave questão social”, afirma.
O defensor público lembra ainda que a preocupação com a efetivação da política nacional foi alvo de preocupação até mesmo do Supremo Tribunal Federal, a partir de uma decisão que determinou que estados e municípios implementem medidas para garantir os direitos da população em situação de rua, independentemente de adesão formal ao PNRV.
Órgãos têm que trabalhar em conjunto, alerta coordenadora do MNPR
A coordenadora do MNPR, Rafaelly Machado destaca como o Movimento vem demandando a adesão ao plano, junto à retomada do Comitê Municipal de Monitoramento e Acompanhamento da Política Municipal para a População em Situação de Rua. “Além da adesão ao plano, é preciso que a Prefeitura, juntamente com seus órgãos públicos, e a sociedade civil organizada possam se adequar nesse acompanhamento para a efetivação das políticas públicas”, defende.
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Declarando perceber um espaço maior para diálogo nesta segunda gestão de JHC, Raffaelly afirma que o MNPR acredita que a adesão vai acontecer. “Só assim a gente vai conseguir diminuir a dor, o sofrimento e os problemas socioeconômicos da população em situação de rua. Não é só com a adesão do plano, mas também com a reativação dessas políticas públicas com a reativação do comitê municipal “, afirmou. “Assim, a gente vai conseguir definir ações e metas, porque uma vez que esse comitê parou de funcionar, parou de se reunir, a população em situação de rua sofreu porque os órgãos têm que trabalhar em conjunto e em intersetorialidade”. Ainda segundo a coordenadora do MNPR em Alagoas, as expectativas são de que o segmento da PopRua participem diretamente destas instâncias, garantindo o protagonismo na fundamentação dessas políticas.
Governo do Estado já aderiu ao plano, mas ainda não foram iniciadas as ações
Quem já aderiu voluntariamente ao Plano, porém, foi o Governo do Estado. Desde dezembro de 2024, foi firmado um compromisso por parte da gestão estadual junto ao Governo Federal para a implementação do Plano. Entretanto, as ações – que devem ficar sob responsabilidade da Secretaria de Estado da Mulher e dos Direitos Humanos (Semudh) – ainda não foram realizadas.
Em nota encaminhada à Mídia Caeté, o Governo do Estado declara estar em fase de alinhamento das ações que serão implementadas. “Em dezembro de 2024, foi firmado um termo de compromisso entre o Governo de Alagoas e o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania para a implementação do Plano Ruas Visíveis, com o objetivo de garantir os direitos fundamentais da população em situação de rua, assegurando o acesso a políticas públicas de forma integrada e articulada entre os entes federativos. O plano propõe medidas estruturadas em sete eixos principais: assistência social e segurança alimentar; saúde; enfrentamento à violência institucional; cidadania, educação e cultura; habitação; trabalho e renda; e produção e gestão de dados. Atualmente, encontramo-nos na fase final de alinhamento das ações que serão implementadas, sob a responsabilidade da Secretaria de Estado da Mulher e dos Direitos Humanos (Semudh), que está organizando o lançamento oficial e, posteriormente, a execução efetiva do plano.”
Um Plano para impulsionar uma Política
Prevendo um orçamento inicial de mais de R$ 982.086.246,22 para a efetivação da Política Nacional para a População em Situação de Rua, o Plano de Monitoramento é justificado por uma necessidade de cumprir com ações sistemáticas que, de fato, deem conta da complexidade enfrentada pela condição de rua. “Não superaremos o grave cenário atual com ações pontuais, superficiais ou esparsas, mas com ações estruturantes, coordenadas, transversais, intersetoriais e implementadas em parceria entre o Governo Federal, estados e municípios. Garantiremos que o orçamento previsto para o Plano chegue às pessoas em situação de rua por meio da transparência e do controle social sobre a aplicação dos recursos, do fortalecimento das institucionalidades da PNPSR e do monitoramento dos órgãos de controle”, descreve o documento.
O problema é que, sem a adesão significativa dos entes, essa efetivação não tem como ser consolidada. “É importante ressaltar que, desde o lançamento da PNPSR em 2009, o nível de adesão à Política foi baixo, contando apenas com 18 municípios, seis estados e o Distrito Federal até 2023”, expõe texto do Plano, reiterando a importância da decisão liminar proferida pelo Supremo Tribunal Federal – STF na
ADPF 976, estabelecendo a observância imediata, pelos estados, Distrito Federal e municípios, das diretrizes contidas na PNPSR.
Ao destacar essa situação, o ofício assinado pelo presidente do Comitê Pop Rua Jus, desembargador Tutmés Airan, reitera:
“A precariedade enfrentada por essa população, marcada pela ausência de moradia, acesso limitado a serviços básicos, insegurança e condições indignas de vida, exige uma resposta articulada e humanizada do poder público. A Política Nacional para a População em Situação de Rua (PNPSR), instituída pelo Decreto nº 7.053/2009, visa assegurar o acesso dessa população a direitos fundamentais, mas, infelizmente, sua adesão pelos entes federativos ainda é limitada”.
De acordo com o defensor público Isaac Souto, foi estabelecido um prazo de 10 dias para que a Prefeitura de Maceió respondesse ao ofício encaminhado. “Esperamos que o Município de Maceió compreenda a importância dessa adesão e adote medidas que realmente impactem na qualidade de vida dessas pessoas, pois a omissão pode agravar ainda mais esse quadro de exclusão social.
A Mídia Caeté procurou a Prefeitura de Maceió para obter alguma resposta a respeito do ofício e de sua adesão – ou não- ao Plano Ruas Visíveis. Até a publicação desta reportagem, nenhuma resposta foi enviada.