Ufal e IMA afirmam que colapso na Mina 18 não afetou qualidade da água na Laguna Mundaú

Financiamento de pesquisas feito pela Braskem gera dúvida quanto a dados apresentados; Universidade ressalta imparcialidade
Coletiva ocorreu nessa segunda-feira (15). | FOTO: Anyelle Cavalcante.

Um clima de apreensão pôde ser notado, na manhã desta segunda-feira (18), na coletiva provocada pela Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e pelo Instituto do Meio Ambiente (IMA) – que contou com a participação de parte da imprensa alagoana reunida na sala dos Conselhos da Universidade, no Campus A.C Simões. A intenção do encontro foi a apresentação de dados resultantes de coletas feitas na Laguna Mundaú após o rompimento na Mina 18, no último dia 10 de dezembro.

Acesse os dados compartilhados pelo Ima e pela Ufal na íntegra

Enquanto profissionais da imprensa demonstravam-se não apenas curiosos, mas preocupados com o impacto que o início do colapso da mina poderia ter causado nas águas da Mundaú (que costuma ser chamada popularmente de Lagoa, apesar de ser uma laguna), os pesquisadores da Ufal – vinculados ao Projeto Laguna Viva – e a representante do IMA, a gerente de laboratório Ana Karine Pimentel, adotaram a narrativa de que o dano causado pelo rompimento era bem menor do que o “especulado”.

A argumentação foi de que o patrimônio ambiental alagoano já havia apresentado uma situação pior em outros momentos históricos (compartilhadas análises de 2011, 2013 e 2016) e de que tragédias ambientais como a depressão do sururu na lagoa e a contaminação de peixes não necessariamente deveriam ser atribuídas somente às atividades de exploração de sal-gema da Braskem (nem ao colapso recente), mas também a outros aspectos socioambientais.

Na explanação do professor Emerson Soares – que é pesquisador do Projeto Laguna Viva – foram mostrados dados provenientes de análises realizadas nos dias 2, 7, 10 (dia do evento com a mina) e 11 de dezembro. As explicações, apesar de minuciosas quase sempre eram acompanhadas do lembrete de que a situação era instável e de que, mesmo com as análises recentes, a situação pode mudar a qualquer momento.

As telas com relatórios apresentadas em projeção e explicadas pelo professor diziam, em suma, que o desabamento de parte da mina da Braskem não teria alterado aspectos como a salinidade encontrada antes do evento na laguna e que elementos químicos como o cloreto de sódio e o magnésio estariam dentro dos níveis já observados em outras análises feitas pelas equipes em pesquisas na laguna.

IMA não apresenta dados sobre fiscalizações e autuações referentes ao problema da poluição na Laguna Mundaú

Na fala da gerente de laboratório do IMA, Ana Karine Pimentel, a contaminação das águas lagunares, que vêm afetando a fauna e a flora aquática, foi atribuída a outros fatores que não a exploração de sal-gema. De acordo com a representante do Instituto, a existência de domicílios no entorno da Mundaú e o esgoto despejado na laguna seriam os fatores que mais contribuíram para a má qualidade da água; no entanto, quando indagada sobre quais providências que o IMA estaria tomando para impedir – ou ao menos minimizar – os efeitos da poluição nas águas da Mundaú, a representante afirmou que, apesar do órgão realizar fiscalizações periódicas, bem como autuações, não há um quantitativo das autuações realizadas pelo órgão fiscalizador ao longo dos anos. “Teria que fazer um levantamento”, disse.

Pesquisadores afirmam que outros fatores contribuem mais para a poluição das águas da laguna | FOTO: Anyelle Cavalcante.

“Os cloriformes são as principais contribuições que a laguna recebe, identificadas até o presente. As variações de salinidade, cloretos que foram apresentadas agora, elas já se revelaram no momento históricos dados de 2011, 2013 e 2016, inclusive em maior quantidade, de modo que a gente não pode dizer que essas alterações são fruto da influência do sal-gema, porque números maiores de salinidade quantidade de cloreto já foram encontrados lá atrás, antes da explosão desses acontecimentos. A gente tem uma variação da contribuição de cloriformes, uma contribuição do oxigênio dissolvido nas margens da laguna, mas tudo indica que é influência dos resíduos, do esgoto, do que seja na laguna: ferro, alumínio. Não concluímos essas análises, mas o que se apresenta até o momento é que essa variação de salinidade, cloreto  salinidade, que era uma das preocupações, já ocorreu me outros momentos na laguna”, disse.

Para os pesquisadores a poluição afeta mais a qualidade da água da Mundaú que o colapso das minas da Braskem

Sobre a escassez do sururu, que vem sendo observada por pescadores e marisqueiras atuantes na Mundaú, o professor Emerson Soares explicou: “são cinco fatores que fazem com que o sururu não se desenvolva na lagoa: os solventes, a quantidade de esgotos, o soterramento em período de chuva (principalmente no mês de junho), que entrega à lagoa pesticidas no período em que o sururu está se desenvolvendo e por causa disso ele não consegue se desenvolver. O alimento do sururu – que é o x do nosso trabalho – não existe por causa da erosão e da contaminação. Estamos com a lagoa cheia de cianobactérias, o sururu começa a reproduzir no mês de agosto, com um aumento de poluição e diminuição do alimento e não por um fator isolados, mas por vários. Já vimos raticida de alto poder na água”, disse.

“Certamente posso dizer que o problema na lagoa está mais relacionado à população urbana. É necessário repensar o sistema de esgotamento na lagoa”, reforçou o professor

Já o professor Josué Carinhanha, do Instituto de Química da Ufal, que pesquisa na laguna com financiamento público há mais de uma década, ressaltou que foram feitas campanhas pontuais para a análise da Mundaú nos meses de fevereiro, setembro e dezembro.

O docente explicou que “principalmente sal, cloreto de sódio, traços de potássio e magnésio. Isso pode impactar na salinidade, teor de alguns metálicos. O que nós vimos? É que em outros pontos da laguna, comparando na mesma época, em outras épocas os valores não eram diferentes. Então, se os valores não variavam em amostragens anteriores e nessas amostragens, não se pode inferir que o rompimento da mina teve impacto nesse momento. Lembrando que cada amostragem é um retrato daquele momento”, esclareceu.

Financiamento de pesquisas feito pela Braskem gera dúvida quanto a dados apresentados; Universidade ressalta imparcialidade

Apesar de o financiamento de pesquisas ser uma das condições previstas no Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) celebrado entre a Braskem e o Ministério Público no ano de 2020, é fato que a presença da mineradora como uma das financiadoras do projeto Laguna Viva acabou gerando uma “pulga atrás da orelha” em diversos profissionais atuantes no jornalismo, principalmente após as alegações de que o rompimento na mina 18 praticamente em nada teria afetado negativamente as águas lagunares.

Visto isso, e os insurgentes questionamentos por parte do público mais crítico, um catalisador para que a coletiva desta segunda-feira (18) ocorresse foi também a preocupação da Universidade em reafirmar o caráter autônomo de suas pesquisas: “a pró-reitora ressaltou que esses recursos são gerenciados pela Fundação Universitária de Desenvolvimento de Extensão e Pesquisa (Fundepes), a partir de editais de projetos de pesquisa, com total transparência e prestação de contas. “Os nossos pesquisadores conhecem a laguna Mundaú e a área afetada pela Braskem. Temos o compromisso de investigar em profundidade os danos provocados pela mineração e propor soluções de mitigação e reparo”, garantiu Iraildes Assunção”, diz um trecho da matéria produzida pela Assessoria de Comunicação da Ufal publicado no site institucional.

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