A invisibilidade das mortes das pessoas em situação de rua em Alagoas

Artigo do advogado Arthur Lira
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Artigo do advogado Arthur Lira*

Invisibilidade das mortes. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Na última sexta-feira (17), o Movimento Nacional da População de Rua (MNPR), contabilizou a 11º (décima primeira) morte, apenas em 2023, de pessoa em situação de rua no estado de Alagoas, após o assassinato do jovem José Douglas, que residia nas imediações do Centro da capital. Coincidentemente, o caso aconteceu um mês depois da coordenadora estadual do Movimento ter sido brutalmente assassinada a tiros no bairro do Benedito Bentes.

O aumento no número de mortes foi uma das pautas discutidas durante a reunião no Palácio República dos Palmares, realizada em 1º de março de 2023, fruto de articulação do Gabinete Civil do Governo do Estado de Alagoas e do Comitê Gestor Intersetorial da Política Nacional para a População em Situação de Rua. Nesse ponto, o Comitê apresentou a necessidade da prevenção, apuração e punição dos atos de violência praticados contra essa população.

Neste sentido, ficou designado a realização de uma reunião, à cargo da Secretaria de Estado da Mulher e dos Direitos Humanos (SEMUDH), com atores da Delegacia de Homicídio e Proteção à Pessoa (DHPP) e da Delegacia Especial dos Crimes Contra Vulneráveis, oriunda da Lei Estadual nº. 8.364/20, e os demais representantes do Comitê. O objetivo do encontro é alinhar a competência para apuração dos crimes de homicídio envolvendo pessoas em situação de rua, haja vista previsão legal (art. 1º, parágrafo único da Lei Estadual nº. 8.364/20) que designa competência para Delegacia Especial.

Entretanto, até o presente momento, não houve nenhum alinhamento das providências apresentadas acima. Ou seja, os crimes de homicídio contra pessoas em situação de rua, conforme foi abordado na reunião supramencionada, permanecem sendo acompanhados pela DHPP, contrariando legislação estadual vigente.

Cumpre destacar que os casos ocorridos em 2023, possivelmente, ainda não foram elucidados pelo órgão investigativo competente, bem como o índice de mortes contra esta população permanece alto, contrariando as estatísticas corriqueiramente apresentadas de redução da violência que, pelo visto, não engloba este público historicamente marginalizado e perversamente invisibilizado em todas as esferas de poder.

Portanto, emerge a necessidade da elucidação dos crimes que têm vitimizado as pessoas em situação de rua no estado de Alagoas, especialmente na capital, onde se concentra o maior número de casos registrados pelo Movimento e constantemente noticiados nos veículos de comunicação local, bem como o estabelecimento de um plano estadual de prevenção à violência para este público, afinal, como consta nos versos do compositor Bob Dylan, “quantas mortes ainda serão necessárias para se saber que já se matou demais?”. Logo, o estado de Alagoas precisa romper com as permanências históricas, daquilo que Achilles Mbembe chama de necropolitica – controle do Estado de quem deve viver ou morrer – e passe a ser garantidor de direitos.

 


 

Advogado do Centro de Defesa dos Direitos Humanos Zumbi dos Palmares e Membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD).

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