Rua e denúncia permanente: as estratégias de Leonardo Péricles e da UP contra a cláusula de barreira e disputa desigual

Compondo única candidatura totalmente negra, Léo Péricles amplia o recado: urnas são insuficientes para deter o fascismo; é preciso mobilizar na rua.
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Candidato à presidência do Brasil, Leonardo Péricles visita Alagoas: aposta de campanha nas ruas diante das disputas desiguais nas eleições. Foto: Wanessa Oliveira

Fez barulho a movimentação feita por militantes da Unidade Popular pelo Socialismo diante da recusa da TV Bandeirantes em incluir o candidato Leonardo Péricles no debate. A falta do único candidato negro em um dos espaços de maior alcance também não passou despercebido por diversas entidades civis, e do movimento negro. Já esperando que o padrão se repita nos próximos debates, além da exclusão ao acesso a recursos de fundo partidário, a Unidade Popular (UP) é um dos partidos que precisa encontrar outras estratégias para visibilizar as propostas – e também as denúncias.

Alagoas foi o décimo terceiro estado visitado pela chapa, que vem buscado se dividir nas ruas – com Léo Péricles em um lugar e a vice, Samara Martins, em outro – para alcançar, no curto período de tempo, um número maior de pessoas dispostas a ouvirem suas propostas e planos de governo. As mensagens se projetam, segundo Leonardo Péricles, em torno de uma série de denúncias, e a maior delas, que faz questão de incluir: é a importância de deter o fascismo através da mobilização nas ruas.

No que diz respeito ao cenário de disputa eleitoral, o foco é a cláusula de barreira. Incluída a partir de uma Emenda Constitucional 97, em 2017, a ferramenta vem sendo conhecida como “cláusula da exclusão” e cria alguns requisitos de desempenho para que partidos tenham acesso a recursos do fundo partidário e também à propaganda gratuita nos meios de rádio e TV. Se antes havia uma delimitação proporcional ao número de votos na Câmara, hoje há partidos que a depender da porcentagem de votos, podem ser totalmente excluídos do acesso às verbas.
Fundada em 2016, a UP é uma das legendas afetadas pela restrição. “Fazemos uma grande denúncia do grande absurdo que é essa cláusula de barreira, que proibiu um partido recém-criado. [Ficamos] sem tempo de TV de rádio, sem acesso nenhum a fundo partidário. Somente com 0,06% do fundo eleitoral. Só aí já partimos de uma condição que contraria a Constituição, que prevê ampla liberdade de organização partidária”, afirma.

“Essa cláusula de barreira foi supostamente criada para diminuir o número de partidos, dizendo que esse é o problema da democracia. Na nossa opinião, o grande problema é a forma como os votos são captados para isso, porque alguns partidos vão ter mais de bilhão do fundo eleitoral ,e ainda recebem doação de grandes empresários. Enquanto isso, partidos como o nosso quase não tem recurso”.

Léo Péricles atenta para o que identifica como uma compra de votos institucionalizada. “Ainda mais para uma população desempregada e que enfrenta várias dificuldades financeiras. Acaba sendo presa fácil para ser contratada no período de eleição e ajudar com que o Centrão – que são partidos de direita – se fortaleça e cresça. Então a denúncia é de médio prazo também para mudança na legislação”.

Não bastasse a ausência de recursos, vem ainda a crítica à participação dos debates na televisão. As emissoras são desobrigadas de convidar candidatos, mesmo sem qualquer justificativa técnica para não incluir todos eles. “É absurdo. Apesar de haver grandes empresários que controlam o processo, eles só estão ali porque tem concessão pública. É um atentado contra a democracia essas empresas definirem que alguns podem estar e outros não. Não concordamos, fazemos denuncia, gravamos vários vídeos e estamos denunciando de forma permanente. Buscamos apoio na sociedade, e agora estudando caminhos jurídicos para garantia de debates”.

O cerceamento da participação incidiu, segundo Péricles, em um debate morno e sem tocar em temas relevantes de fato para a maioria da população brasileira. “Foi um verdadeiro jogo de comadres e compadres. Não entrou em problemas centrais, como a crítica ao atual presidente e sua tentativa de dar um golpe no Brasil junto ao alto comando das Forças Armadas e empresários. Nada foi falado. Assim como não foram denunciadas as chacinas e toda a violência contra o povo negro, pobre e indígena nesse pais. São vários elementos que precisa ter participação de todos, inclusive a gente que entra nesses problemas concretos”.

A exclusão se torna ainda mais significativa quando considerado que Léo Péricles é o único homem negro candidato à presidência. “Em nossa candidatura, o antirracismo é um dos pilares e cumprimos assim dois papéis. Um é histórico, porque tem 92 anos que nenhum candidato negro de periferia, de esquerda e trabalhador é candidato à presidência. Segundo, que na história do Brasil nunca houve chapa 100% negra, com candidatos a presidência e vice-presidência”.

Além da representação, há as próprias pautas a serem contempladas nos projetos de governo, que geralmente ignoram as condições da maioria do povo brasileiro.

Governabilidade

A questão é que, dentro dos caminhos da institucionalidade, grande parte das decisões não se limitam ao Executivo. Questionado sobre como pretendia garantir a governabilidade em meio à atual configuração do Congresso, Leonardo Péricles responde que vai buscá-la no meio do povo.

“Somos imensa maioria da população, e é com ela que queremos governar. Não queremos estar nas mãos do Centrão, que são partidos fisiológicos, de direita e contra o povo. Não vamos aceitar chantagem de grupos que vão manter o Brasil do jeito que sempre foi, ou piorar a situação para a maioria, porque é isso o que acontece no brasil. São várias leis votadas contra a maioria, sem chamar a maioria”, diz.

O desprendimento ao Centrão, para o candidato da Unidade Popular, se dará através de um chamado amplo para que o povo decida através de plebiscitos e referendos revogatórios. “Muito mais democrático 157 milhões de pessoas participarem das decisões sobre o orçamento, e a urna está aí para facilitar os resultados, do que colocar nas mãos de 117 deputados e alguns senadores”.

Um dos plebiscitos que Péricles já aponta como necessário é a decisão sobre o orçamento no Brasil, incluindo a recusa ao pagamento da suposta “dívida pública”. “Hoje [o orçamento] serve aos bancos, ao sistema de agiotagem nacional e internacional, e não ao povo brasileiro. Metade dos recursos é para pagar juros de uma dívida que, segundo vários especialistas, já foi paga várias vezes. Então nossa proposta é revogar isso, aprovando o orçamento junto do povo.”

Assim, segundo Péricles, ao invés de ser acionado diretamente para eleger candidatos, a população também será convocada para decidir sobre orçamento. “Nenhum candidato chega e fala que é contra a saúde e a educação pública, mas vai lá e aprova a emenda constitucional 95, que congela investimento nestas áreas por 20 anos. Temos que ter referendo para revogar tudo isso, assim como a reforma trabalhista, que só gerou desemprego, e a reforma da previdência”, acrescenta.

“São formas de governar que não só incluem o povo, o que é muito pouco, mas em que o povo precisa mandar no orçamento, uma vez que as riquezas são produzidas pelo conjunto de trabalhadoras e trabalhadores, que é o conjunto da maioria da população brasileira”.

Estar nas ruas é o principal

Péricles repete, no entanto, que estar nas ruas é o principal. Tanto para visibilizar suas denúncias e proposta eleitoral, como para alertar para a escalada do fascismo e da extrema-direita no país. “Temos grandes perspectivas e estamos felizes com a campanha. Encaramos esse desafio desigual porque, para registrar o partido, precisamos de mais de 1,2 milhão de assinaturas e não tivemos nenhum apoio de meios de comunicação. Só o trabalho popular nos garantiu”, conta.

Estar nas ruas, distribuir panfletos, olhar nos olhos das pessoas, vai se tornando a principal estratégia para garantir suas ideias, mas Leonardo Péricles reforça que a prioridade máxima deve ser deter o golpe do Bolsonaro, do Centrão e das Forças Armadas. “Dia 7 de setembro convocamos o povo para ruas. Isso é o principal para o Brasil: deter o golpe. A vice-presidente da Argentina sofreu atentado e a resposta do povo argentino foi imediata, indo às ruas aos milhões para deter o fascismo”, conta.

“As urnas são muito importantes, mas a história nos mostra que são insuficientes para deter o fascismo. Quem pode deter o fascismo é a mobilização dos povos nas ruas e esse é o trabalho central que consideramos na UP. Tem golpista que está indo para a rua no dia 7 e nós temos que ir para o contragolpe, não só em favor da democracia mas para ainda ampliar”.

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