Médico oferta laudos ‘desobrigando’ vacinas para pessoas com doenças autoimunes e neurodegenerativas

Marcos Falcão contesta a ciência e incentiva métodos não comprovados para o combate à Covid-19
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Vacinação, uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e isolamento social. Essa é a tríade defendida por diversos especialistas, em todo o mundo, como principal mecanismo de combate à Covid-19. Embora isso soe unânime, medidas como o tratamento precoce e, sobretudo, a “reivindicação” pela não obrigatoriedade da vacina surgem como entraves bastante perigosos.

Mesmo com entidades médicas, como a Organização Mundial de Saúde (OMS) e o próprio Ministério da Saúde, defendendo a política de vacinação, a adesão dos brasileiros tem caído. A OMS e o Fundo das Nações Unidas para Infância (UNICEF) já até emitiram um alerta afirmando que o Brasil possui um dos maiores índices de queda de vacinação no planeta. 

Um estudo publicado, em setembro de 2020, pela revista científica The Lancet mostra que o percentual de pessoas que acreditam na eficácia do método, aqui no Brasil, é de apenas 56%. A pesquisa afirma ainda que somente 63% dos brasileiros consideram que a vacina é uma forma segura de imunização.

Tedros Adhanom | Foto: Salvatore Di Nolfi/AP

Em declaração no dia 02 de julho, o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom, pediu aos líderes mundiais que trabalhem em conjunto para que 70% da população esteja imunizada até julho de 2022.   

“Essa é a melhor maneira de controlar a pandemia, de salvar vidas e de levar à recuperação econômica global, evitando que as variantes consigam se disseminar”, defendeu Tedros, que reafirmou que a expectativa é que, até setembro deste ano, 10% das pessoas estejam vacinadas, incluindo trabalhadores e grupos de risco.

O diretor disse ainda que há “confusão, complacência e inconsistências em medidas de saúde pública e na aplicação delas” e que “é preciso uma abordagem consistente, coordenada e abrangente”.

TRAZENDO O CONTEXTO PARA ALAGOAS

De acordo com o mais recente boletim do Observatório Alagoano de Políticas Públicas para o Enfrentamento da Covid-19 (OAPPEC) da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) – divulgado nessa segunda-feira (5) – houve redução de 5% no número de óbitos e de 9% dos novos casos da doença na última semana no Estado. Apesar de o observatório não entrar mais a fundo nas causas, o professor e coordenador do projeto, Gabriel Bádue, considera que a vacinação é um dos fatores que contribuíram para o cenário.

De encontro a demais especialistas, médico alagoano questiona vacina. | FOTO: reprodução.

“Hipoteticamente, é plausível acreditar que a vacinação esteja contribuindo com esse resultado, mas dado o atual nível de cobertura vacinal, é provável acreditar que tal resultado deve-se à combinação da vacinação com as medidas de controle”.

E complementa afirmando que, com o aumento do número de pessoas imunizadas, a tendência é que haja uma descida ainda mais acentuada da curva de contágio: “Isso tem sido observado em outras partes do mundo, em que o processo vacinal está mais avançado”. 

Badué reforça, porém, que ainda há a necessidade de intensificar os métodos de prevenção, como uso de máscara e álcool em gel, distanciamento e a própria imunização coletiva.

“Os dados ainda indicam um grande número de infectados, incluindo incidência de casos, óbitos e casos suspeitos. Então, apesar de vislumbrar uma redução na transmissão, a manutenção das medidas de controle são essenciais para a continuidade da redução na transmissão”, afirma. 

CONFIRA O RELATÓRIO DESTA SEMANA.

No Twitter, Falcão lista enfermidades que podem receber o suposto laudo. | FOTO: Reprodução.

Na contramão do que afirmam os especialistas acima, o médico alagoano Marcos Falcão tem incentivado, nas redes sociais, o tratamento imediato, desencorajado o uso de máscaras e, mais recentemente, se colocando à disposição para elaborar laudos desobrigando a vacinação de pacientes com doenças autoimunes e/ou neurodegenerativas.   

Pelo Twitter, Falcão disse que existem determinadas doenças que podem receber laudos que permitam a não vacinação e publicou a lista. Em outra publicação, o médico diz que defende “a liberdade e a saúde” e que “devemos evitar que pessoas com riscos sejam expostas a um experimento em larga escala”.

A Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR) pensa diferente e afirma que não há contraindicação para pacientes com doenças autoimunes reumatológicas se vacinarem. 

“A comissão de doenças endêmicas e infecciosas da SBR esclarece a população que pacientes com doenças reumáticas (DR), incluindo artrite reumatoide, espondiloartrites, artrite psoriásica, lúpus eritematoso sistêmico, esclerose sistêmica (esclerodermia), Síndrome de Sjögren primária, miopatias inflamatórias e vasculites não representam por si só, qualquer contraindicação para receber qualquer vacina contra a COVID-19”, informou a entidade em seu perfil no Instagram. 

Em relação às doenças neurológicas crônicas e degenerativas, o próprio Ministério da Saúde as incluiu no grupo prioritário de comorbidades do Plano Nacional de Operacionalização (PNO) da vacinação no país, no último mês de maio.

Marcos Falcão em duas publicações. | FOTO: Reprodução.

O grupo contempla doenças hereditárias e degenerativas do sistema nervoso ou muscular, pacientes com deficiência neurológica grave, paralisia cerebral e esclerose múltipla ou condições similares, além de doenças cerebrovasculares e neurológicas crônicas que afetam a função respiratória.  

No dia 27 de junho, Marcos Falcão tuitou contestando a necessidade de obrigatoriedade da vacinação. “Se a vacina é tão boa, por que obrigar?”, indagou. Vale ressaltar que o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a União pode determinar aos cidadãos que se submetam, compulsoriamente, à vacinação contra a Covid-19, de acordo com a Lei 13.979/2020.

No WhatsApp divulgado nos perfis de Marcos, quando a conversa é iniciada, surge uma mensagem automática, onde são ofertados serviços médicos, exames, prescrição de medicamentos e acompanhamento pelo valor de R$ 250. Tudo isso na modalidade de teleatendimento.  

HISTÓRICO

Falcão em tweet do dia 24 de junho | FOTO: reprodução.

Marcos Falcão Farias Monte possui registro no Conselho Regional de Medicina do Estado de Alagoas (CREMAL) com o número 8608-AL. Ele se formou pela Ufal. 

A Mídia Caeté tentou diversas vezes entrar em contato com o médico para falar sobre o assunto, mas não obteve sucesso. Sua atendente nos respondeu e informou que passou a mensagem ao médico, que não nos retornou.

Nas redes, Marcos Falcão se autodeclara ativista político de direita e promete tratamento imediato para Covid-19. Falcão ainda questiona a vacinação e o uso de máscaras e contesta a ciência em suas publicações.

Recentemente, o médico teve conteúdos retirados do YouTube por violarem as políticas sobre informações médicas, segundo um post que ele próprio compartilhou no Twitter. Em outro momento, Falcão cita diretamente o presidente do CREMAL, Fernando Pedrosa, e afirma que não será intimidado. 

Falcão em tweet do dia 4 de maio | FOTO: reprodução.

A Mídia Caeté também procurou o conselho – por meio da sua assessoria de imprensa – questionando se existe uma relação mais direta entre Marcos Falcão, Fernando Pedrosa e a entidade e se o órgão endossa as opiniões e as práticas do médico. 

As respostas também não foram enviadas até a publicação desta reportagem.

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