Mais um final de semana foi marcado por manifestações de apoio ao atual Governo Federal em todo o Brasil. Por mais que – infelizmente – tais ações tenham tornado-se corriqueiras, não deixam de chocar e causar revolta nas pessoas minimamente conscientes.
A cada manifestação, a sensação de que não se trata somente de uma indignação seletiva é mais escancarada. Estamos presenciando e normalizando a publicização de um projeto nefasto, autoritário e extremamente perigoso, mesmo que possa parecer, aos olhos dos menos atentos, apenas um bando de inconsequentes vociferando absurdos.
Um adendo: Leonardo Dias é o mesmo que tentou emplacar o título de Cidadão Honorário a Bolsonaro, contribuiu para atrapalhar a imunização em um ponto de vacinação e foi o autor de um Projeto de Lei (PL) contrário à obrigatoriedade da vacina.
Entre as “reivindicações” do grupo, estão questões como a contrariedade ao lockdown e às medidas restritivas, o voto impresso, os fechamentos do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Congresso e a – nunca esquecida – cruzada contra a ameaça comunista.
Umberto Eco (1932-2016) foi um escritor, professor e filósofo italiano. Em 1995, ele publicou uma lista com 14 características inerentes ao Fascismo no New York Review of Books. Algumas delas podem muito bem ser aplicadas ao cenário atual e às pautas defendidas no sábado.
IRRACIONALISMO, RECUSA À MODERNIDADE E O MEDO DO DIFERENTE
É muito perceptível tais particularidades em qualquer apoiador do governo vigente. Existe uma conhecida campanha contra a ciência e as orientações de especialistas, uma forma de negacionismo escancarada que faz questão de desconsiderar estudos e propagar a desinformação.
Segundo Eco, para adeptos dessa corrente, a modernidade traz degradação e precisa ser coibida. Acho que podemos exemplificar esse pensamento com o desejo pelo retorno do voto impresso.
Já o medo do diferente pode ser caracterizado pela aversão constante ao debate e às concepções contrárias, além da necessidade de supressão das minorias em prol do bem de determinadas classes. Podemos ver isso nos pedidos para fechamento do Congresso e do STF e o apelo infundado para prisão do ex-presidente Lula.
RESSENTIMENTO, ULTRANACIONALISMO E O INIMIGO EXTERNO
O filósofo também cita que grupos simpáticos ao Fascismo se apropriam de problemas estruturais – muitas vezes causados por eles mesmos – para levantar suas pautas. Sob tal ótica, a crise é uma arma que legitima a propagação dos ideais vis, com base em uma “liberdade de expressão” totalmente abjeta.
O uso constante das cores verde e amarela e da bandeira nacional, o hábito de contestar e subvalorizar o que vem de fora e a obsessão pela batalha contra um inimigo externo e imaginário (leia-se comunismo) são pontos muito sintomáticos e que são presentes de qualquer uma das bravatas usadas nessas manifestações.
POPULISMO SELETIVO, CULTO AO HERÓI E NOVILÍNGUA
Umberto Eco menciona ainda a existência de um populismo seletivo, que consolida o elitismo social, físico e financeiro. Para demonstrar isso, basta olharmos quem compõe esses grupos e que foram às ruas na defesa das suas pautas egoístas, sempre enaltecendo uma figura que os represente através de um discurso messiânico e sectário.
Por fim, é preciso trazer à tona toda a pobreza argumentativa, de raciocínio e até linguística de uma grande parcela dos defensores dessas condutas, pois estão sempre à procura de teorias conspiratórias e falácias argumentativas que validem o que pensam. Atitudes que reforçam o conceito de Novilíngua concebido por George Orwell na excelente distopia 1984.
Apesar de muitos considerarem “excessiva” e “desproporcional” a relação entre o que está ocorrendo com as práticas fascistas, é fundamental que estejamos preparados para o pior, por mais pessimista que isso possa soar.
Só reforçando: não é só ignorância.