Onde esta Rota vai dar? Modelos de desenvolvimento, ideias de crescimento, e alguns fatos contra os argumentos

POR WANESSA OLIVEIRA

Receptivo Sonho do Patacho. Foto: Wanessa Oliveira

“Imagine que ao longo de 30 km você percorre e conhece um trecho de área verde preservada, mirantes com um vista de tirar o fôlego, praias lindas e tons de azul do mar que fazem a região ter o apelido de Caribe brasileiro’.” É assim que começa um dos inúmeros convites turísticos para conhecer a chamada Rota Ecológica dos Milagres, um percurso que perpassa pelas cidades de Passo do Camaragibe, São Miguel dos Milagres e Porto de Pedras. O texto, que pode ser encontrado aqui , caracteriza o principal argumento usado inicialmente por um local cujas mudanças vêm descaracterizado a paisagem natural e impondo um modelo de desenvolvimento ainda pouco compreensível.

Em artigo publicado no Observatório da Economia Latinoamericana, disponivel neste link, essa mudança no padrão de desenvolvimento da chamada Rota Ecológica é analisada como resultante de uma disputa de dois modelos de negócios que hoje se encontram numa disputa confusa na localidade.

Na pesquisa, as autoras Rennisy Rodrigues, Edvânia Torres e Mariana Zerbone, identificaram que, existem dois grupos. Um primeiro é caracterizado pelos proprietários das chamadas “pousadas de charme”, que operam com a divulgação dos “traços rústicos e luxuosos de seus equipamentos imobiliários a fim de atrair um público interessado em praias desertas, privadas e nas singularidades do local, que paga valores altos para isto”.

Entretanto, este grupo passou a ser atravessado por um projeto de características bastante opostas Iniciado pelo grupo Tamo Junto, responsável pelo “Réveillon dos Milagres”, e outros eventos na região, o foco não é apenas a atração do turismo e festa em si, como também atrai segmentos do mercado imobiliário e investidores da construção civil, transformando – em um curto espaço de tempo de cerca de cinco anos – as três cidades em um canteiro de obras e oferta de lançamentos de empreendimentos. A ação é, ainda, fomentada pelo próprio Governo do Estado, conforme vai se confirmando diante dos recursos aportados e diversas outras sinalizações.

PDITS: R$ 559,44 milhões e ausência de documento prévio apresentado para audiência pública

Em 3 de agosto deste ano,a população foi acionada para a audiência pública final para apresentação do Plano de Desenvolvimento Integrado de Turismo Sustentável (PDITS) para a região da chamada Área de Preservação Ambiental Costa dos Corais, que compreende os municípios do litoral norte que estão inseridos neste território. O encontro aconteceu em uma escola municipal do município de Porto de Pedras, Complexo Educacional Belmira Lins, e teve participação massiva de funcionários da Prefeitura na audiência, além de políticos locais. A Mídia Caeté questionou, na ocasião da audiência, em qual local havia sido disponibilizado o documento para apreciação prévia. Entretanto, foi respondido que ao projeto não havia sido disponibilizado publicamente, e que para ter acesso seria necessário solicitar, antes, à Secretaria Estadual de Turismo. Ainda assim, houve aprovação do projeto na atividade local.

Prefeitos dos três municípios e secretários reunidos para apresentação do PDITS. Foto:Wanessa Oliveira

Segundo representantes da empresa contratada, LOG Estratégia Desenvolvimento e Gestão, as audiências a essa camada da população foram feitas em oficinas anteriores, garantindo suas participações. Embora o documento final não tenha sido apresentado, ou mesmo essas pessoas estivessem presentes, a audiência finalizou com os dados demonstrados no slide apontando um investimento de R$ 559.44 milhões distribuídos em 48 ações, que foram resumidamente distribuídas por vetores de desenvolvimento:

Ainda durante a audiência, alguns questionamentos foram feitos, especialmente focados na preocupação com a participação de moradores locais em todo o processo, como marisqueiras, pescadores, artesãos, uma vez que a plateia era basicamente composta por funcionários da prefeitura de Porto de Pedras.

Uma das pessoas que efetuou o questionamento, foi a moradora de Tatuamunha, e proprietária de uma pousada de charme, Marta Dueñas, que provocou o questionamento sobre como o poder público inseria de fato a população local na discussão sobre desenvolvimento de turismo sustentável, tendo em vista inclusive os aspectos de trabalho e de analfabetismo no local. Após a pergunta, entretanto, funcionárias da prefeitura que estavam no local iniciaram um tumulto, justificando que a pergunta seria ‘ofensiva’ em relação à população de Porto de Pedras.

Com salário médio de 1,5 salário mínimo mensal, e uma proporção de pessoas ocupadas em 12% em relação à população total, a cidade de Porto de Pedras tem ainda, conforme dados de 2021 pelo IBGE, um percentual de 52,2% de domicílios com rendimento mensal de até meio salário mínimo por pessoa. Embora a taxa de escolarização para pessoas de 6 a 14 anos esteja em 97.2%, segundo dados do IDEB, entre ensino fundamental e ensino médio as matrículas decaem em, respectivamente, de 1340 para 329 matrículas.

Uma análise sistematizada pela pesquisadora Rennisy Rodrigues em seu artigo – que você pode ler na íntegra clicando aqui – aponta alguns dados publicados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas que permitem entender um pequeno recorte da realidade social.

Pesquisadora Rennisy Rodrigues vem debruçado sobre capital imobiliário na Rota Ecológica e o impacto nas comunidades. Foto: Arquivo Pessoal

Nesse sentido, a autora prossegue no artigo que “em relação aos resultados da educação básica, anos fi nais do ensino fundamental em 2017, afere-se que os municípios estão entre os piores de Alagoas. Porto de Pedras, por exemplo, fi cou na 97ª posição dos 102 municípios alagoanos, todavia, no mesmo ano, ocupou a 4ª posição no PIB per capita do Estado”

Historicamente, a ocupação da população vinha sendo composta prioritariamente por trabalho nas usinas – que passa por certa transição para eucaliptocultura, com agricultura de subsistência, pesca, além de serviços para as prefeituras ou benefícios sociais. Entretanto, empresários que antes mantinham seus terrenos para plantio de coco, ou mesmo cana- de-açúcar, vêm cedendo os terrenos para especulação imobiliária, sobretudo diante de informações obtidas através da ocupação em cargos estratégicos.

Onde a Rota vai dar?

Se, de um lado, ainda há aqueles que disponibilizaram seus terrenos para as pousadas de charme, por outro lado, as vias de desenvolvimento propostas pelo PDITS – apresentado nos slides, uma vez que não obtivemos ao cesso ao projeto completo – denotam um outro tipo de proposta para a região.

“Enquanto uns querem exclusividade, o estado segue construindo vias , construindo o Aeroporto Costa dos Corais, que terá fluxo do Brasil inteiro, e escoamento da unidade de produção do Porto de Suape. É uma dinâmica imensa que demonstra como o discurso da rota ecológica é o discurso da rota ecológica dos ricos”, relata Rennisy, em entrevista à Mídia Caeté. .

Em meio à disputa de dois projetos e uma população local que, habitada a uma outra forma de vida, convivência e acessos, o questionamento sobre os impactos de toda esta mudança na concretização do propagandeado ‘desenvolvimento’ da região impele a um questionamento: onde esta Rota vai dar?

Para responder esta pergunta, Rennisy contextualiza a exploração imobiliária em todo o estado.

“O capital imobiliário tem um circuito, que expande, explora, produz e reproduz capital, faz a exaustão daquele estado e vai emigrando. Em Alagoas, tínhamos uma expansão muito maior no su, na região metropolitana que está consolidada na Massagueira, Barra de São Miguel. Então houve uma parada, com empreendedores temporariamente falidos, e que foram então para o projeto de expandir o litoral norte”, explica. “Há estudos que mostram a obsolência dos espaços turísticos. E estas as características: sem nenhum planejamento, numa rapidez incrível, e uma violência imensa que se atrela à estrutura que a gente vive em Alagoas, das famílias que se impõem a partir da força e dos órgãos do Estado”.

Pesquisadora Rennisy Rodrigues reflete sobre desenvolvimento e suas concepções na Rota Ecológica

A pesquisadora ainda acrescenta que, ainda que haja políticas públicas, elas terminam sendo direcionadas para fins específicos e de forma limitada. “Ali vai gerando uma exaustão. Os empreendedores acabam não sendo procurados porque eles mesmos estão destruindo um local em que queriam ganhar dinheiro com esta narrativa. As pessoas por estar dentro desse processo de alienação e fetichização da natureza, terminam por ter uma queda na qualidade de vida. A especulação vai ganhando aos bolos e depois comprando em outros lugares, de uma forma que todo o litoral de Alagoas vai sendo privatizado, as comunidades tradicionais são extintas em algumas partes, ou apropriadas na lógica da reprodução de singularidade em locais mais caros”, comenta.

Nesse sentido, diversas contradições vão se colocando na prática. “A Rota Ecológica não poderia ter resort, mas já sabemos que será construído um resort Salinas em Porto de Pedras”, enumera. “Os condomínios fecham os acessos ao rio e a Prefeitura acaba tendo que abrir estrada para que a população conseguisse pelo menos chegar à praia. E abre ainda estrada em áreas de encosta para que possam ter mais espaço nas encostas”.

Os conflitos ainda terminam acontecendo entre os municípios, em meio à confusão de nomes. “Exemplo disso é que houve uma corrida. A corrida Milagres. Criaram tênis com a marca Milagres. E o povo de Porto de Pedras não queria que a corrida passasse pela cidade porque não citava Porto de Pedras, só Milagres”, comenta. “A Capela de Milagres fica em Passo do Camaragibe. A Festa de Milagres também não fica em Milagres”.

A exclusão da comunidade termina por constituir mais uma característica desse desenvolvimento em curso. “Não é só o racismo que expulsa os pescadores dali, mas ele existe de diversas formas. Turistas querem tirar foto com pescador no barco, mas se forem comer, não querem o pescador ali pois querem que a praia seja exclusiva deles. Até a ausência de fiscalização efetiva de órgãos ambientais é algo que serve a um objetivo. As ONGs já registram o aumento de violência e morte de negros na região”, menciona.

Ainda de acordo com os estudos apresentados, há evidências de presença de facções que passam a ocupar estes lugares para vender drogas – não para as população pobre, mas para abastecimento do mercado das raves, e pessoas hospedadas”.

Quanto aos jovens locais, as opções mais apresentadas – para além da construção – são as pousadas. “E assim os filhos dos pescadores perdem a identidade local, absorvidos pela construção civil, bares e restaurantes, ou mesmo puxados pelo crime que cada vez mais se amplia ali”.

Outra manifestação de racismo ambiental identificada pela autora está nos assentamentos de reforma agrária situados ainda na parte alta. “Aquelas pessoas também vão ser expulsas, porque estão desenvolvendo pousadas e outros atrativos também nessas áreas afastadas, para construir um turismo rural dentro do litoral”.

O que resta à população local é, neste sentido, se afastar dos recursos naturais, se não por falta de acesso – mas por falta de tempo. “A população passa a não viver mais o local porque está servindo aos donos. Ao invés de estarem de fato na praia, estão na pousada. Não tem dinheiro para viver porque tudo encarece. Há diárias em pousadas que valem três vezes mais do que o salário dessas pessoas. Tudo isso em um local com diversos outdoors vendendo esse fetiche, construindo ainda uma poluição visual, além da construção de cercas”.

Ao analisar o modo como as mudanças vem acontecendo na Rota Ecológica, a diretora do Instituto Yandê, Bárbara Pinheiro, também demonstra preocupação. “A percepção é de que acontece de forma muito rápida, de cima para baixo, a partir de poderes econômicos muito fortes, e implementando várias questões com o argumento de que está trazendo progresso”.

Pinheiro também reafirma esse ciclo. “ Há uma repetição de outros lugares quando segmentos de alto poder aquisitivo chegam retirando a população local das melhores regiões. Eles vendem a casa e vão morando cada vez mais para cima, formando favelas. Começa, também, a questão das drogas e do tráfico e começamos a ver jovens morrendo. Há um elevado número de circulação de tráfico de drogas nas piscinas naturais, durante a alta estação. Daí a violência chega junto”,

Qual o plano para a Rota

A pergunta de Marta Dueñas, na ocasião do PDITS, não foi por acaso. A jornalista e empresária gaúcha decidiu deixar o estilo de vida cosmopolita para um projeto de vida vinculado à natureza. Após estudos e mapeamentos pelo país, chegou em 2019 ao povoado de Tatuamunha como destino para construir três casas e viver da escrita e da hotelaria de charme numa empresa que identifica como de porte familiar.

Jornalista e empresária Marta Dueñas escolhe Tatuamunha para mudança de trabalho e estilo de vida.

Marta Duenas: plano de mudança para Tatuamunha era motivado por novo modelo de vida atrelado à natureza. Foto: Wanessa Oliveira

Dueñas e seu então companheiro foram atraídos pela perspectiva de encontrar um lugar “seguro, preservado, lindo, em que há sol o ano inteiro, e que teria alguma possibilidade de crescimento mesmo diante da possibilidade de investimento, que é de um tamanho de negócio familiar”, conta. “Não queríamos uma mina de ouro, mas uma vida conectada à natureza. Pode parecer uma romantização, e acho que é, mas era este o projeto”, relata.

O problema é que os maiores empreendedores e políticos locais já ensaiavam outro projeto. “Em 2018, não conhecia Patacho ou Tatuamunha e ainda ouvia falar de Milagres, mas demorei para contextualizar, porque ora Patacho parecia Milagres, ora Milagres parecia ser cidade. Não conseguia entender. Já existia uma festa famosa para o público de São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro, que era a Festa de Milagres”.

Ao chegar ao local, Marta encontrou uma série de dificuldades e elenca a falta de transparência de informações como a principal delas. Seja para conseguir as licenças, ou para obtenção de serviços, e informações sobre o lugar que passava a viver. Apesar disso, prosseguiu até a construção das casas que hoje disponibiliza para a hospedagem, enquanto reside em uma terceira.

Sua vivência em contato com a natureza, entretanto, passa a enfrentar os primeiros impactos.

“Porto de Pedras tem uma característica muito linda. É uma tira. É linda, poética e forte. E, realmente tem divisão de comunidade e praia. Quem mora na praia já era majoritariamente pessoas de fora, de diversos tamanhos de empreendimento. Pousadas, pousadeiros, e raras pessoas locais. Alguns veranistas de Maceió ou Recife que já tinham casas muito antigas aqui e que depois também foram vendidas para tais pousadas de charme. Mas podia se contar na mão os locais nascidos na praia. A maioria já estava na comunidade, perto da estrada da AL 101”, diz.

“A urbanização se deu no entorno da pista, onde tinha oferta de luz, esgoto, água encanada mas sem tratamento. No trecho de praia, não. Nem luz tinha. Foi daí que comecei a compreender a história e configuração da natureza, social, econômica e política”, comenta. “A faixa de praia pertencia a fazendeiros. E, quando começam as sucessões, vem as mudanças de estilo de vida e estilo de negócio também. Os coqueirais passam a ser vendidos por serem menos rentáveis e viram loteamento”.

 

Com os loteamentos vendidos às construtoras imobiliárias, já amplamente propagandeados nas festas, internet e outdoors, iniciam também as grandes construções. Neste momento, Marta Dueñas recorda que a Prefeitura chegou a tomar uma iniciativa.

“Houve um tempo que percebi que a prefeitura estava preocupada. Tanto que iniciou a discussão para construir um plano de ordenamento urbano, já que não havia obrigação de Plano Diretor pelo tamanho da cidade, e era um investimento muito alto para o município desse tamanho”, rememora.

“Veio empresa de Recife que fez rodadas de conversa com a comunidade, em que participei, e fizeram uma metodologia muito participativa que foi bem legal, no sentido de que temos que olhar quem é a comunidade aqui. Foi quando percebi que muitos moradores locais estavam aqui antes, sentiam as mudanças, mas algumas vezes não sabiam expressar. Aquela coisa do signo e da simbologia. Muitas pessoas olham, ficam atordoadas e não conseguem explicar o que acontece aqui. O barulho, as mudanças geográficas no local. O não se sentir bem na praia que era seu lugar antes. Não consegue dizer que a praia esta privatizada, mas diz que não consegue chegar nela, não consegue ir de bicicleta”, comenta.

 

Ao perceber o boom imobiliário com grandes estruturas condominiais na localidade, Marta conta já sentir que a transformação não só afetaria seu negócio com a pousada de charme, como ainda a própria qualidade de vida com a qual investiu suas economias. “Nessa troca que fiz, tenho bastante ônus- como falta de acessibilidade, pois estou num lugar que não tem ônibus, taxi, não tem uber. Tenho perdas financeiras vivendo aqui. Então preciso entender se o lugar vai continuar assim e se ainda terei os bônus para fazer valer o ônus”, analisa.

Dueñas também tentou convidar mais pessoas para participar mais ativamente dos processos decisório. “Perguntava para o pessoal daqui se iriam para a reunião, chamava, e me diziam ‘não é pra mim não’. Como se não fosse um espaço para o pessoal local. E não é a prefeitura que diz que não é pra eles. São eles que estão dizendo. É tão anacrônico, mas não sentem que são parte da mudança do próprio espaço e isso tá ligado no ontem, na escravidão. Aqui há descendentes de pessoas escravizadas. Netos de avós que moravam em usinas. Dizem ‘minha vó morava no Açúcar’. É um projeto de estado sem comunicação. É Brasil assim, e aqui é bem forte”, comenta.

Algumas pessoas ainda compareceram. Entretanto, segundo Dueñas a discussão do Plano de Ordenamento não teve uma conclusão e até o momento não houve qualquer vislumbre de encerramento.

“Tem uma coisa lindíssima que é a vivência dessa região. Eles estão sendo retirados, e muitos ficam catatônicos sem saber o que está acontecendo. O raciocínio, a lógica que a vida urbana traz, vem com tudo e se os rtira dessa vida da natureza, o que eles vão fazer? Daí a gente vai entender quem são os donos dessa lógica que chega, e são os donos da terra, que por sua vez também são os donos da política”, diz.

As mudanças ambientais foram logo identificadas. “Uma das coisas me impactou na chegada é que os coqueiros que eram mais numerosos tinham iniciais dos donos dos terrenos. A mata atlântica que tinha dado espaço para os canaviais e depois para os coqueirais, agora se tornam loteamentos. O estado empacota isso e começa a dizer que o turismo ecológico é a menina dos olhos, mas aqui não tem turismo ecológico. Na medida em que não tem legislação forte, baseado nos viveres, pensares e fazeres, e nas discussões com pessoas daqui. Não é de base ecológica”, distingue. “E quando não aceita grandes estruturas hoteleira, mas passa a aceitar grandes estruturas condominiais, é menos ecológico ainda. Quando vem os condomínios, e passam a preencher a terra toda de casas- ainda que de veraneio, em que as casas ficam vazias, e não tem pessoas. Isso não é ecologia. Longe de ser”, comenta.

Essa realidade pode ser visualizada com maior concretude na famosa praia de Patacho – conforme você pode ler na reportagem clicando aqui.

O aprendizado com a população local

Marta conta que veio com o que identifica ser um “sonho romântico de mudança de vida”, uma aposta que ainda tenta manter e foi enriquecida de conhecimento, ao longo do tempo, sobre as pessoas que já viviam na localidade que não têm um estilo de vida “focado em resultados”. Na prática, o aprendizado foi mais longo do que imaginava.

“Fui aprendendo a olhar e respeitar quem tem a vida aqui. Hoje eu quero pescar amanhã eu não quero. Isso era difícil para mim. Uma mulher branca de uma capital urbanizada. E aí me deparo com este modelo de vida que não vale menos do que outro modelo de vida, o que eu conhecia. Acho que muitas pessoas não estão prontas para ter esse entendimento, mas o Estado precisa ter, porque cabe ao Estado saber disso quando pensa em matriz de desenvolvimento, tendo obrigação de olhar para suas pessoas e respeitá-las em suas histórias”, retrata. “Estou disposta a conhecer e respeitar essa história e apanhei muito para isso, porque vim com vícios de outras regiões, vícios de mercado. E não é o mercado que deveria mandar na vida da gente”.

Assim, quando se fala no desenvolvimento dentro de uma proposta de Rota que se propõe Ecológica, Marta considera a necessidade de refletir sobre a narrativa apropriada.
“Uma Rota Ecológica é uma palavra muito forte. E o que é ecologia? Para mim ecologia é não ter um edifício nessa praia? É não ter tantas edificações? É ter seus prós e contras, mas ser alicerçada na natureza e nas personas locais, porque são também natureza. Quando falo a natureza, não falo dos mangues e bichos, mas na comunidade que já estava aqui. Eu sou estrangeira dela, mas vim morar. E a gente sente também, embora não seja igual a quem é daqui. Aqui antes era a rotina da maré, mas como vai fazer se agora a mare já nem é mais tão importante?”, questiona.

As Prefeituras de Porto de Pedras, Passo do Camaragibe e São Miguel dos Milagres, foram exaustivamente procuradas pela Mídia Caeté, para obtenção de respostas sobre todos os pontos elencados. Até o momento da publicação desta reportagem, nenhuma delas nos respondeu.

Essa reportagem foi contemplada pelo edital Bolsas de Reportagem Justiça Climática – AJOR e iCS: Justiça Climática e o Enfrentamento ao Racismo Ambiental no Brasil”, promovido pela Ajor, Associação de Jornalismo Digital e o iCS, Instituto Clima e Sociedade, no âmbito do The Climate Justice Pilot Project. 

MÍDIA CAETÉ – Plataforma multimidiática sem fins lucrativos voltada a reportagens especiais e investigativas, com independência editorial.

Reportagens: Wanessa Oliveira Apoio/Entrevistas: Vivia Campos. Revisão: Marcel Leite. Webdesigner: Leonardo Reis. Fotografias: Wanessa Oliveira e Vivia Campos. Ilustração: Jacqueline Aldabalde Redes Sociais: Marcel Leite